Mauritânia rouba a cena e destaca Thalita Carauta em "Todas As Flores"

 A novela exclusiva do Globoplay vem apresentando um enredo central dos mais atraentes. João Emanuel Carneiro tem proporcionado para o público conflitos dignos de um bom dramalhão em "Todas as Flores". Porém, há uma personagem que vem roubando a cena desde a sua primeira aparição: Mauritânia, vivida pela sempre ótima Thalita Carauta. A personagem é de um núcleo secundário, mas já entrou para o principal e desde então só cresce em cena. 

A saga de Mauritânia é claramente inspirada no clássico "Uma Linda Mulher", filme de 1990, protagonizado por Richard Gere e Julia Roberts. Atriz de filmes pornôs e ex-prostituta, a personagem começou a novela enfrentando dificuldades em arrumar novos trabalhos por conta da idade. Os diretores queriam atrizes mais novinhas para os longas adultos. Para culminar, ainda vivia uma relação tóxica com o malandro Joca (Mumuzinho). Mas tudo mudou quando conheceu Raulzito (Nilton Bicudo) no velório de um ex em comum. O ricaço propôs um relacionamento e ela topou, mesmo desconfiada. 

Na verdade, o irmão de Guiomar (Ana Beatriz Nogueira) queria se vingar da esposa, Patsy (Suzy Rêgo), porque ouviu uma conversa da mulher o ridicularizando e torcendo para morrer logo. Isso porque Raulzito estava com uma doença terminal. Então, iniciou um namoro com Mauritânia e deixou todos os seus bens para a personagem.

Acabou que o milionário nem faleceu vítima de sua enfermidade e, sim, de um incêndio provocado acidentalmente justamente por Patsy na loja da Rhodes, onde era um dos sócios. A ex-garota de programa herdou a parte na empresa, o apartamento, o dinheiro, enfim, tudo. É verdade que a trama jogou a verossimilhança no lixo porque segundo as leis brasileiras a companheira de uma pessoa que faleceu tem direito a 50% dos bens mesmo que o falecido queira deixar a outra metade para um terceiro. Mas a situação na teledramaturgia normalmente é assim para ter o clichê da transformação na vida da pobre e a ruína da rica. É preciso voar.

E desde que Mauritânia passou a mandar e desmandar na Rhodes que Thalita Carauta teve a oportunidade de mostrar o quão está à vontade na pele da personagem. O perfil é caricato e não há como fugir disso. Aliás, nem é um demérito. Mas a intérprete sabe evitar aquele exagero do exagero que muitas não conseguem. Há uma linha tênue entre a pureza e a malícia que Thalita tem equilibrado com maestria. Até porque a agora empresária responsável pela inovação na moda da empresa e em seus hábitos já protagonizou algumas cenas de bastante sofrimento. A família sempre a rejeitou por conta da forma como ganhava a vida antes de enriquecer e os embates com sua mãe, Darcy (Zezeh Barbosa), a machucaram muito, assim como a rejeição da filha, Brenda (Heloisa Honein). É uma mulher extremamente carente e solitária, ao mesmo tempo que contagia qualquer ambiente com sua energia caótica. 

A cena em que Mauritânia revidou o deboche de Vanessa (Letícia Colin) e a humilhou na loja foi um dos melhores momentos de Thalita na trama até então, assim como o enfrentamento que a agora sócia da Rhodes teve com Luís Felipe (Cássio Gabus Mendes). A personagem sentiu o baque das pesadas ofensas do tio de Rafael (Humberto Carrão), mas não abaixou a cabeça. Todas essas nuances foram expostas com precisão pela atriz, que está a cada dia melhor na novela. Aliás, a ex-prostituta seria a pessoa mais amada e aclamada pelo grande público se a trama estivesse na tevê aberta. É aquele típico perfil que cai na boca do povo com facilidade. Mas também é importante lembrar que Thalita não é atriz apenas de perfis cômicos. A intérprete ganhou uma oportunidade e tanto na primorosa "Segunda Chamada" ---- série com duas temporadas, a primeira em 2019 na Globo e a segunda em 2021 no Globoplay ----, onde emocionou na pele da professora Eliete. Já em novelas foram apenas duas com personagens de destaque: "Páginas da Vida", em 2006, onde brilhou como a empregada Lídia, e em "Segundo Sol", de 2018, quando interpretou a atrapalhada Gorete. 

Mauritânia tem sido a responsável pela leveza de "Todas as Flores". A novela de João Emanuel Carneiro tem conflitos centrais bastante pesados e a personagem defendida lindamente por Thalita Carauta rende momentos impagáveis, bem mais do que o chamado 'núcleo cômico' oficial da história, onde situações repetitivas envolvendo traição tomam conta da narrativa. A atriz está ótima e o destaque é merecido.