quarta-feira, 21 de setembro de 2022

Tudo sobre a coletiva online de "Rota 66 - A Polícia que Mata", nova série do Globoplay

 A Globo promoveu nesta segunda-feira, dia 19, a coletiva online da nova série do Globoplay: "Rota 66 - A Polícia que Mata", baseada no livro homônimo de Caco Barcellos, lançado há 30 anos e vencedor do Prêmio Jabuti. Protagonizada por Humberto Carrão, que interpreta o jornalista que passou oito anos investigando os assassinatos cometidos pelo batalhão especial de São Paulo, a trama tem oito episódios e os dois primeiros estreiam na plataforma de streaming nesta quinta-feira, dia 22. Participaram da coletiva Humberto Carrão, a atriz Naruna Costa e Caco Barcellos. Fui um dos convidados e conto sobre o bate-papo.


Caco Barcellos expôs sua animação com a estreia e emoção que sentiu com a atuação de Humberto, que o representa na série: "É uma grande expectativa. Quando escrevi esse livro, um pouco antes do lançamento, trabalhei oito anos na investigação. Eu imaginava fazendo um roteiro para o cinema. Sempre que encontrava alguma vítima da rota, tentava captar algum diálogo das pessoas. Da narrativa, dos momentos de episódios violentos pensando em construir diálogos para o futuro roteiro. Mas o tempo me absorveu para o trabalho na televisão. E agora ver realizado visualmente tudo o que apurei é muito especial, emocionante. Fiquei muito sensibilizado com a atuação dele. O Humberto é incrível, que cara maravilhoso", observou o jornalista. 

Humberto Carrão não escondeu a sua satisfação com o trabalho: "Fico muito emocionado com esse momento. Não é sempre que aparecem projetos assim. Percebi a força do que a gente tinha em mãos. Sou doido pelo Caco, ele é uma pessoa muito admirável. Acho que a construção do personagem Caco foi a partir da pesquisa do roteiro.

Tive dois dias muito intensos com o Caco e pude perceber de perto que o livro é sobre a polícia que mata, mas a ótica dele é sobre a violência. A série é construída de uma forma que presta uma homenagem ao jornalismo do Caco. Os personagens ficam, as histórias não se encerram. É uma história dura. A primeira dificuldade foi escolher quais os casos a se contar. O normal seria cada história se encerrar em cada episódio, mas elas vêm e voltam. O Caco não era um personagem do livro, então tive que pesquisar a vida dele", contou o ator.

Naruna Costa falou a importância de viver Anabela (mulher que perdeu o marido, inocente, assassinado pela polícia) na série: "É muita emoção mesmo. Sou nascida e criada na periferia de São Paulo. Eu vivi na minha infância e juventude. Quando chegou a Anabela e surgiu a oportunidade de contar no meu ofício essa história foi muito importante o sim. Para quem tem uma relação direta com essas histórias é algo difícil. A Anabela é a tradução dessa força. Ela tem a vida devastada pela violência policial, o marido dela é assassinado e tido como bandido. Mas era trabalhador e um homem correto. Uma família preta dos anos 70. Ela é destruída pela morte do pilar da família. E acima de tudo a imagem que foi construída dessa morte foi muito pior porque gerou várias 'mortes'. Ela perdeu o emprego porque não se trabalha com gente vinculada a bandido. Ela vai tentar justiça, vai atrás da justiça. Isso faz dela uma militante. Ela vai atravessando aas décadas sem se perder dessa luta. As Mães de Maio (organização de mães e parentes de 493 vítimas dos Crimes de Maio em 2006, onde mais de 400 eram negros e indígenas) foram minha maior referência. Que mostram ao Brasil o tempo inteiro que nossas histórias não estão sendo bem contadas. A dor delas é a tradução viva que tem muita coisa errada. É um Brasil fundado em cima de muitas mortes, principalmente pessoas pretas, e ainda carrega esse painel na nossa atualidade. A série mistura o que é de fato a realidade do livro e o que a gente quer contar. Anabela é uma referência de muitos casos e como a violência é catastrófica e cruel. A minha figura enquanto artista carrega a representatividade. O racismo estrutural é tão grande no audiovisual que as oportunidades são muito específicas. Então o corpo negro acaba contando e representando várias histórias. É uma representatividade que está colada em mim", expôs a atriz. 

O jornalista comentou sobre a dura rotina de seu trabalho: "A maior dificuldade foi conviver com as histórias das pessoas vítimas de violência. Meu objetivo era fazer uma denúncia. Não há pena de morte no Brasil, mas percebia que essas histórias eram apresentadas como ações de legítimas defesa e eram cerca de quatro mortes por dia. E percebia muitas contradições. Fui ficando muito assustado. Quando eu perguntava para a justiça se o fulano era criminoso ou não, ela me dizia que não e foram mil e duzentas vezes que tive essa resposta. Só não desisti diante daquele susto porque sofro com a injustiça de uma pessoa alheia a minha história. E, ao invés de provocar uma paralisia do sofrimento, me dá energia para continuar. Claro que pensei várias vezes em largar, mas tudo me dava energia para continuar. Acabo sendo um correspondente de guerra porque a nossa guerra é permanente. É o estado brasileiro atacando a sociedade civil. Isso é muito duro. Aprendi com o tempo que quando você vai contar a história de uma chacina vira uma convivência intensa com as pessoas que estão sofrendo. Se a pessoa é abordada apenas por ser negra e foge já é suspeita e leva um tiro na nuca. Só depois vão investigar quem era. Mas a primeira coisa que fazem é desqualificar a pessoa que matam. E me dei conta que os mortes continuam com você. Vão para a sua alma. Não me recordo quantas vezes acordei com pesadelos horrorosos", relembrou Caco.

O ator falou do dia que conheceu Caco e como a temática da produção segue atual: "O livro foi lançado há 30 anos. O personagem Caco acreditava que a contundência do material que ele coletou iria transformar a polícia. Mas meses depois aconteceu o massacre do Carandiru... E os números hoje são muito piores do que os números que fizeram o Caco contar essa história. Tem a violência aos jornalistas na rua, tem a politização cada vez maior da polícia. Não à toa que matadores quando se candidatam a políticos se elegem. Os matadores policiais com ambições midiáticas, enfim. Isso está claro. Quando eu conheci o Caco, a gente foi ao Complexo do Salgueiro (comunidade em São Gonçalo, Rio de Janeiro) porque o Caco estava fazendo uma matéria dos dez anos da morte da juíza Patrícia Acioli. No dia que eu o conheci ele estava trabalhando no mesmo assunto da série, que é a morte policial. Há uma frustração porque os números continuam muito altos mesmo depois de tantos trabalhos já feitos", analisou o Humberto Carrão. 

A nova série do Globoplay representa um soco de realidade na cara do telespectador. Precisa ser forte para assistir. Mas vale a pena. É praticamente um documentário encenado. A coletiva serviu para contextualizar a nova produção. 

5 comentários:

Anônimo disse...

Nem sabia dessa série, mas amo o Carrão.

Ane disse...

Gosto muito do Caco Barcellos mas não
sei se teria coragem de ver a série.
Me impressiono fácil...

Ane
De Outro Mundo
Beijos! :-*

Anônimo disse...

Parece muito boa!!!

Marly disse...

Achei a iniciativa ótima. Este é um tema que precia urgetemente ser conhecido, debatido etc.

Jovem Jornalista disse...

Assistirei em breve. Sua resenha está impecável!

Boa semana!

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Até mais, Emerson Garcia