sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

"Entre Irmãs" sensibilizou e aproveitou o talento de Marjorie Estiano e Nanda Costa

Já virou uma espécie de ''tradição'' a Globo transformar longas da Globo Filmes em microsséries no início do ano. Nos últimos sete anos, cinco filmes foram adaptados. É um sinal claro de corte de custos e também compensação das bilheterias aquém do esperado. Ao invés de produzir uma minissérie, como fazia antigamente, transforma uma trama já pronta, dividindo em partes. Porém, quase todas essas adaptações se mostraram desnecessárias e em histórias que não despertavam muita atenção. O único acerto havia sido com "O Tempo e o Vento", em 2014. Agora, todavia, há outro êxito da adaptação da emissora: "Entre Irmãs".


O longa é baseado no livro "A Costureira e o Cangaceiro", de Frances de Pontes Peebles. Produzido pela Globo Filmes e Conspiração Filmes, o filme foi escrito por Patrícia Andrade, com colaboração de Nina Crintzs, e dirigido por Breno Silveira. Infelizmente, a bilheteria não fez jus ao primor da trama. Nas três primeiras semanas, por exemplo, foram apenas 39 mil pagantes. Um injusto fracasso. A historia tem um forte potencial dramático e explora o brilhantismo do elenco escalado. Entretanto, é preciso reconhecer que a duração de cerca de 2h40 se mostra bastante excessiva, cansando quem assiste na telona em virtude da narrativa mais lenta. Por isso mesmo a adaptação para microssérie foi um acerto. O enredo fluiu bem melhor e ainda com cenas inéditas inseridas.

A história de Emília (Marjorie Estiano) e Luzia (Nanda Costa) não demora para envolver o público, expondo as diferenças e a cumplicidade entre as irmãs que cresceram juntas, sob os cuidados da tia, a trabalhadora Sofia (Cyria Coentro), uma costureira talentosa que ensina o ofício para as meninas. Luzia sofreu um grave acidente na infância, atrofiando o braço ---- ganhando o cruel apelido de 'vitrola'.
Esse problema a deixou mais forte e cada vez mais introspectiva, enquanto a irmã sempre se mostrou mais sonhadora e até inocente. As duas acabaram se complementando e nunca esconderam o amor que as unia, embora as brigas fossem uma constante.

A segunda tragédia na família ocorreu com a chegada de cangaceiros a Taquaratinga do Norte (1930), que sequestraram as três, exigindo que costurassem roupas novas para o bando. O líder Carcará (Júlio Machado), então, acaba se interessando pela braveza de Luzia e a leva embora com ele, para o desespero da tia e da irmã. O grito desesperador de Emília foi dilacerante e expôs a entrega de Marjorie, enquanto a praga rogada por Sofia demonstrou a precisa emoção de Cyria na cena. Nanda também emocionou com a partida de Luzia, exibindo a divisão da personagem, que no fundo queria ir, ao mesmo tempo que tinha a vontade de permanecer com a única família que tinha. A morte de Sofia, semanas depois, totalmente alucinada e chamando pela sobrinha, foi outro grande momento da trama, fechando a participação da atriz brilhantemente.

Essa espécie de 'prólogo' do filme consistiu o primeiro capítulo da microssérie, iniciando os diferentes rumos das protagonistas. Enquanto Luzia passou a viver com os cangaceiros, Emília se casou na cidade grande com Degas (Rômulo Estrela), realizando um sonho que aparentemente tinha se concretizado. Esse paralelo da vida das irmãs, com cada uma seguindo um rumo, ficou muito bem retratado através de cenas intercaladas que duraram menos de um minuto. O roteiro que envolve as duas personagens é riquíssimo, aproveitando todas as possibilidades de cada situação. Enquanto Luzia tem uma vida mais intensa e perigosa, Emília encara uma rotina de etiquetas e preocupações sociais, além de um casamento falido. Aliás, a ironia do destino da trama é um dos pontos altos: a cangaceira, que nunca sonhou com um amor, acabou encontrando o homem de sua vida e a menina que idealizou seu príncipe se casou com um homossexual reprimido. Impressionante a entrega de Marjorie e Nanda. As duas protagonizam uma sucessão de cenas difíceis e que exigiram tudo delas. O curioso é que só contracenaram no começo e no final da história, mas mesmo assim pareciam conectadas sempre. Destaque especial para o último momentos juntas, quando Luzia entregou seu filho para a irmã cuidar, pouco antes de caminhar para a morte. Atrizes com 'a' maiúsculo.

O elenco, inclusive, é um show à parte. Além das irretocáveis protagonistas, Fábio Lago expõe sua versatilidade interpretando o cruel Orelha, cangaceiro de má índole do bando de Carcará, enquanto pode ser visto dando vida ao delicado Nick em "O Outro Lado do Paraíso". O líder dos cangaceiros, por sinal, é defendido com competência pelo ótimo Júlio Machado, que tem uma evidente química com Nanda Costa. Letícia Colin faz uma maravilhosa participação vivendo a doce Lindalva, protagonizando cenas de imensa delicadeza ao lado de Marjorie Estiano ---- o momento em que Emília conhece o mar e nada nua com a nova amiga foi de uma sensibilidade ímpar. Cláudio Jaborandy se destaca na pele do intolerante Dr. Duarte Coelho, que no fundo não é má pessoa. E Rômulo Estrela mostra o ótimo ator que sempre foi, convencendo na pele de Degas, um rapaz de bom coração que sofre por não poder demonstrar para todos os amor que sente pelo amigo Felipe (Gabriel Stauffer). Vale destacar ainda Livia Falcão (como Dona Conceição) e Rita Assemany, muito bem interpretando a sogra arrogante Dona Dulce.

"Entre Irmãs" é uma produção primorosa e a Globo acertou em cheio quando a transformou em microssérie. Os ganchos ficaram muito bons, despertando interesse em continuar acompanhando a história. A abertura criada, ao som de "Aponte" ---- cantada por Maria Bethânia e composta por Nanda Costa, Lan Lanh e Sambê ---- também ficou linda. Só não deu para entender o porquê do corte de uma das cenas mais delicadas do filme: o momento em que Emília e Lindalva dançam. Não precisava e quem não viu o longa merecia acompanhar essa sequência. Mas, deixando essa ressalva de lado, a trama se mostrou um belo chamariz para a programação de 2018 da emissora. Um enredo forte, envolvente e com grandes interpretações.

25 comentários:

Anônimo disse...

Série soberba e Marjorie e Nanda estupendas! Delícia de texto!

Vivian disse...

Endosso tudo. Parabéns por mais uma crítica sensata. Marjorie é a melhor atriz da sua geração!

Anônimo disse...

Poxa, tinha spoiler no texto e agora fiquei triste...

Xaiene disse...

Uma crítica tão boa quanto essa série. Nem sabia que teve filme e foi fracasso.

FABIOTV disse...

Olá, tudo bem? Eu assisti ao filme no cinema. Gostei bastante. Foi um dos melhores longas nacionais que assisti no ano passado. Gostei bastante do trabalho do ator Romulo Estrela. Abs, Fabio www.tvfabio.zip.net

Eliton Ribeiro disse...

Ótima crítica Sérgio. Realmente uma obra primorosa, muito bem produzida, com atuações emocionantes. Marjorie e Nanda estavam maravilhosas, assim como Cyria, Rômulo e Júlio. Foi impossível conter as lágrimas diante do drama das irmãs, história dilacerante que emociona.

Fernanda disse...

Fiquei arrepiada com essa série e abismada com o talento dessas duas atrizes maravilhosas! A cena final foi linda!

cantinhovirtualdarita disse...

Olá vim deixar um bom final de semana
dizer que estou voltando a postar no Blog
desejar um ano de tudo que for bom pra vc
Te elogiar novamente .....Qdo puder me visite
será sempre um prazer !! serginho querido!!

_________༺❀༻_________
Rita

Débora disse...

Essa série foi fantástica. Tinha ouvido falar brevemente do filme só não imaginei que tivesse sido fracasso de bilheteria. Agora se for pra Netflix vai bombar de acessos, aposto! rs
Marjorie é sempre maravilhosa, uma estrela que nunca se apaga. Agora a Nanda me surpreendeu com um papel totalmente fora da comédia que está habituada. Provou que pode interpretar personagens diversos e não apenas ficar presa na "piriguete".

Unknown disse...

Duas irmãs separadas pelo destino. Esse pode ser o resumo do cordel dramático de Breno Silveira.
O drama centra-se nas personagens que têm diferentes ideais de vida.
O ponto positivo do drama está aí. A trama consegue elaborar muito bem o começo da história. O interessante está na forma de contar como a vida delas é circular, pois tudo o que uma imaginava para a outra é trocado e invertido. Além disso, é legal notar o modo como o filme aborda os valores matrimoniais, questões como a homossexualidade, política, ciência, questão social e o amor.
A atriz Marjorie Estiano está muito bem em seu papel. Todo mundo sabe que muitos são os estereótipos apresentados por atores ao interpretarem um personagem nordestino. Mas, a atriz curitibana conseguiu com proeza apresentar uma ótima nordestina. O público acreditou de verdade em sua performance e nos emocionamos com ela. Porém, esse talento não foi tão bem explorado e deixa sua personagem um tanto dramática demais.

Sérgio Santos disse...

Obrigado, anonimo. E concordo com vc.

Sérgio Santos disse...

Mt obrigado, Vivian!

Sérgio Santos disse...

Desculpe, anonimo. Eu cheguei avisar no Twitter e no Facebook.

Sérgio Santos disse...

Idem, Fabio.

Sérgio Santos disse...

Fico honrado, Xaiene.

Sérgio Santos disse...

É exatamente isso, Eliton!

Sérgio Santos disse...

Foi arrepiante msm, Fernanda.

Sérgio Santos disse...

Vc sumiu, Rita. bjss

Sérgio Santos disse...

A Globo jamais permitirá ir pra Netflix, Débora. rs Vai pra Globo Play mesmo e Tele Cines. Bjsss

Sérgio Santos disse...

Bom comentário, Oath.

izabel disse...

A tentativa de fazer dessa trama uma história épica pode não ter fracassado totalmente, porque o enredo tem seus méritos. Entretanto, o resultado pleno nunca é alcançado. Principalmente, porque seu desenvolvimento sofre da ausência de ápices ao longo da jornada de suas personagens. Ou seja, embora elas passem por diversas desventuras, tudo sempre parece emocionalmente regular, sem variações de intensidade. Nesse sentido, a trilha sonora quase ininterrupta é outro fator que contribui para essa sensação.

Entretanto, as reviravoltas são muitas deixando o enredo muito longo e cansativo. Sem falar que a maneira como o roteiro nos introduz essas histórias, sempre mesclando duas tramas diferentes que se entrelaçam em eventos parecidos, deixa o fio condutor um tanto piegas.

Seu conjunto é razoavelmente coeso e se faltam conflitos com intensidade, há — ao menos -um arco dramático que se fecha de forma satisfatória.
O desfecho não agradou muito. Principalmente devido aos cortes exagerados que mais pareciam uma maneira rápida de acabar o conto. Ou seja, ainda que seja interessante, o longa está mais com cara de um resumo de novela do que de uma obra da sétima arte.
Ainda sim, a dramaturgia está inovado na TV aberta.

izabel disse...

Outro problema GRAVE que interfere na chance de ver as produções são os horários tardios que todas emissoras (SBT, Rede TV, Band, Record, Globo, etc, etc, etc) faz para prejudicar o público pois fica impossível assistir tão tarde.

Luli Ap. disse...

oie Sérgio
sabe que quando saí do cinema fiquei pensando nesse filme que achei maravilhoso mas um tantinho cansativo com suas 2h40 que seria perfeito numa minissérie, e que presentão de início de ano!
Ameeeeeeeeeeeei rever esse épico que aliás é bem fiel ao livro <3
Atuações impecáveis e o tipo de obra que permanece com a gente muito tempo depois de ter terminado!
Ameeeeeei, me emocionei e me encantei <3
Bjs Luli
Café com Leitura na Rede

Sérgio Santos disse...

Não foi tão tarde, Izabel. Logo depois da novela das nove.

Sérgio Santos disse...

Pois é, Luli. Eu tb vi o filme no cinema e achei mt cansativo 2h40. Como microssérie funcionou bem melhor. bjsss