Ana Beatriz Nogueira foi uma ótima surpresa em "Todas as Flores"

 Todo ator tenta evitar ficar marcado como intérprete de um tipo só. E a armadilha costuma acontecer quando o profissional vai muito bem na pele de um determinado perfil de personagem. Aí todo autor o escolhe para viver perfis parecidos. O telespectador sabe de vários casos assim. Não é algo raro na teledramaturgia. Por isso é tão bom ver Ana Beatriz Nogueira como Guiomar em "Todas as Flores", novela original Globoplay, escrita por João Emanuel Carneiro e dirigida por Carlos Araújo (o texto tem spoiler). 

 A atriz é uma das mais talentosas do país e engrandece qualquer elenco. Sempre bom vê-la em cena. Mas Ana já estava virando quase uma expert em mães narcisistas, controladoras e interesseiras. Vinha de uma sequência em seus últimos trabalhos. A mais lembrada é Eva, de "A Vida da Gente", exibida em 2011 e reprisada ano passado por conta da pandemia. Foi seu melhor papel na carreira. A autora Lícia Manzo repetiu a bem-sucedida parceria com a amiga em "Um lugar ao Sol", encerrada no início do ano, e a 171 Elenice era um dos trunfos da novela das 21h. Entre outras mães controversas que a intérprete defendeu tão bem estão a Ilana, de "Caminho das Índias" (2009); a Emília, de "Além do Tempo" (2015); e a Néia, de "Rock Story" (2016). 

 Guiomar chegou para quebrar a sequência. João Emanuel deu a oportunidade para a atriz viver uma mãe amorosa, íntegra, compreensiva e doce. Um perfil que muita gente não imaginava ver sendo interpretado por Ana Beatriz Nogueira. Não por falta de talento, mas por falta de oportunidade dada pelos demais escritores. E como o papel foi bem defendido.

Não por acaso, virou uma das melhores personagens da novela logo na primeira leva de capítulos (são cinco capítulos semanais disponibilizados toda quarta-feira na plataforma de streaming). O telespectador se viu 'conquistado' por aquela poderosa empresária que se mostrou uma grande amiga de seu filho, Rafael (Humberto Carrão), e teve um imediato apreço pela futura nora, Maíra (Sophie Charlotte). 

 A esposa de Humberto (Fábio Assunção) também tinha uma relação muito bonita com seu irmão, Raulzito (Nilton Bicudo). Já com seu outro irmão, Luís Felipe (Cássio Gabus Mendes), os embates eram constantes. E a ricaça nunca engoliu muito Zoé (Regina Casé) e nem sua nora, Vanessa (Letícia Colin). Entre tantas virtudes, a personagem ainda primava pela inteligência, algo raro na ficção em se tratando de perfis de boa índole. Não demorou para desconfiar da proximidade entre Zoé e Humberto até flagrá-los em sua casa comentando sobre o futuro de Vanessa e Rafael. A partir de então, iniciou uma investigação e descobriu o caso dos dois e o esquema de tráfico humano da grande vilã. De quebra, ainda desvendou a mentira da ex-nora sobre a volta do câncer durante a gravidez. 

 Ana Beatriz Nogueira teve uma sintonia visível com Humberto Carrão e as cenas da dupla eram de muita cumplicidade. O filho tinha em sua mãe um porto seguro. A atriz também protagonizou ótimas cenas com Letícia Colin, Sophie Charlotte, Fábio Assunção, Mariana Nunes (Judite) e Regina Casé. Aliás, o embate final de Guiomar com Zoé e Humberto foi brilhantemente interpretado pela veterana. A decepção, e frustração, a indignação e o ódio daquela mulher ---- diante de tantas mentiras em muitos anos de casamento ---- foram expostos com a entrega de uma profissional que sempre arranca elogios em seus trabalhos. Uma pena que a personagem tenha saído tão cedo da história. A morte da empresária, juntamente com o falecimento de seu irmão, Raulzito, marcou a primeira virada da trama. 

 "Todas as Flores" vem despertando a atenção do público e um dos principais acertos foi a presença de Ana Beatriz Nogueira na pele de uma mãe tão diferente de tudo o que vinha interpretando nos últimos anos. A história perde uma potente personagem e a atriz já está fazendo falta.