terça-feira, 22 de março de 2022

"Quanto Mais Vida, Melhor!" e "Um Lugar ao Sol" não mereciam a baixa audiência

 Após um longo período de reprises, por conta da pandemia do novo coronavírus, a Globo estreou duas novelas inéditas quase em sequência: "Um Lugar ao Sol" ingressou na faixa nobre no dia 8 de novembro  e "Quanto Mais Vida, Melhor!" começou no horário das sete no dia 22 do mesmo mês de 2021. Infelizmente, desde então as duas produções não vêm obtendo bons índices de audiência. Mas a verdade é que os folhetins não mereciam os números tão abaixo do que a emissora esperava. 

As novelas esbanjam qualidades, são muito bem dirigidas e têm todas as características de uma história propícia para seus respectivos horários. A trama de Lícia Manzo marca a estreia da autora na faixa das 21h, após as irretocáveis "A Vida da Gente" (2011) e "Sete Vidas" (2015) no horário das seis. Já a produção de Mauro Wilson é sua estreia como novelista solo, após um longo tempo como colaborador e autor de séries, como "Os Amadores" (2005/06/07), "A Fórmula" (2017) e "Ilha de Ferro" (2018). 

"Um Lugar ao Sol" sofreu uma redução de capítulos porque começou a ser gravada antes da pandemia. Os trabalhos precisaram ser interrompidos e meses depois retomados, mas ainda com poucas vacinas para a população. Ficou com apenas 107 capítulos, desmembrados em 119 por conta de um esticamento de última hora por conta dos atrasos nas gravações de "Pantanal". Lícia não guardou conflitos nos primeiros meses e apresentou uma história ágil, cheia de acontecimentos. Nem assim os índices reagiram.

Todavia, é verdade que, faltando cerca de dois meses para seu encerramento, a trama começou a andar em círculos e perdeu o fôlego. Ainda assim, manteve a qualidade e se mostrou superior a muitas outras obras já exibidas na faixa. A autora tem conseguido explorar temáticas importantes através de personagens críveis e situações de fácil identificação. Os perfis são recheados de virtudes e defeitos. É possível sentir raiva e torcer pela mesma pessoa em apenas um capítulo. Isso porque todos são humanos. A saga de Christian (Cauã Reymond), que usurpou a vida de luxo do irmão gêmeo Renato, vem sendo muito bem contada. É a primeira vez que um protagonista se comporta como uma espécie de vilão de sua própria vida. Ele criou todas as armadilhas que o assombram. É quase um beco sem saída, o que desperta uma expectativa muito maior para o final da história. Bem difícil imaginar um desfecho feliz para aquelas pessoas, incluindo Bárbara (Alinne Moraes) e até Lara (Andréia Horta). 

Aliás, os núcleos paralelos também despertaram muita atenção, vide a trajetória de Rebeca (Andréa Beltrão); a derrocada de Elenice (Ana Beatriz Nogueira); o romance de Ilana (Mariana Lima) e Gabriela (Natália Lage); a canalhice de Túlio (Daniel Dantas), o romance de Santiago (José de Abreu) e Érica (Fernanda de Freitas), enfim. A direção de Maurício Farias também merece uma menção especial. O diretor tem feito angulações ousadas, sabe aproveitar o melhor de cada ator, foca em expressões faciais durante sequências delicadas e ainda explora os instantes de tensão da melhor forma com uma trilha incidental que faz a diferença. A trilha sonora, inclusive, é outro êxito da produção. 

Já Mauro Wilson tem apresentado uma novela das sete deliciosa, onde a comédia e o drama se misturam de maneira harmônica. A premissa diferente para um folhetim precisa ser elogiada. Usar o toque lúdico logo na primeira semana para mostrar os quatro protagonistas recebendo uma segunda chance da Morte (A. Maia), após um acidente de avião, foi uma sacada de mestre, pois é o único horário onde a ideia poderia ser utilizada sem cair no ridículo. E tem sido ótimo acompanhar a saga de quatro pessoas tão diferentes e com tantas peculiaridades que os deixam cativantes. Ao mesmo tempo fica evidente como o quarteto se complementa e melhora quando se junta, ainda que eles não percebam. Também fica claro o roteiro bem amarrado diante da missão que cada um terá na vida do outro. Guilherme (Mateus Solano) é um cirurgião cardíaco que tenta disfarçar a insegurança emocional com sua arrogância e grosseria; enquanto Flávia (Valentina Herszage) é uma menina frágil que se esconde atrás de uma mulher sensual e provocativa. Paula Terrare (Giovanna Antonelli) é uma empresária milionária que transborda egocentrismo e soberba, mas tem um segredo de feridas emocionais que a devasta por dentro. Sua válvula de escape vira seu amor por Neném (Vladimir Brichta), jogador de futebol que teme o futuro e por isso não desapega o passado. Protagonistas bem desenvolvidos e interpretados que ganharam um novo fôlego com a troca de corpos, onde um passou a viver a rotina do outro. Clichê comum no cinema, mas inédito em folhetins. 

A direção de Allan Fiterman é um show à parte. A trilha é recheada de músicas que fizeram muito sucesso com outras roupagens e muitas vezes as canções se transformam em personagens com direito a um bom tempo de protagonismo. É perceptível a musicalidade do folhetim. Não apenas pelos momentos em que os protagonistas cantam, como também pela importância que a música tem para embalar cada casal ou cena, algo que era comum nas novelas, mas que infelizmente acabou se perdendo com o tempo e com o fim da venda de CDs. "Together" (Sia); "Believe" (Cher); "Can`t Get You Out Of My Head" (de Kylie Minogue na voz de Ayrton Montaroyos), "Pretty Savage" (Blackpink), "Quando Fui Seu Par" (Jaffar Bambirra) e "Vem Neném" (Harmonia do Samba) ---- além da 5ª Sinfonia de Beethoven da abertura ----, são algumas delas. 

"Um Lugar ao Sol e "Quanto Mais Vida, Melhor!" são novelas que mereciam muito o sucesso. Lamentavelmente, os quase dois anos de reprises por conta da pandemia afastaram parte do público. A retomada do hábito será uma difícil missão da televisão aberta, não só da Globo, pois os baixos índices também são expostos na concorrência. Mas é uma pena que as primeiras produções 'sacrificadas' sejam dois folhetins tão bem escritos e produzidos. Lícia Manzo e Mauro Wilson têm presenteado o público com histórias da melhor qualidade. 

17 comentários:

Anônimo disse...

São de fato histórias repletas de qualidades, que apenas tiveram o azar de estrearem em uma época ingrata como a das festas de fim de ano. Mas o desempenho em audiência das novelas (re)reprisadas nas tardes da TV Globo, aliado à ascensão dos números do atual folhetim das 18h15min, "Além Da Ilusão", deve melhorar com o passar dos meses o cenário atualmente enfrentado por "Um Lugar Ao Sol" e "Quanto Mais Vida, Melhor!".

Guilherme

Fatyma Silva disse...

Novelas com boas histórias, adoro!

Desejo boa noite e ótima quarta-feira.

Beijos

Anônimo disse...

Quanto mais vida melhor eu detestei e deixei de ver. Um lugar ao sol decepcionou-me pra valer no momento em que Lara, levianamente e precipitadamente, se envolveu com Ravi, levando o rapaz para a cama, como se estivesse desesperada por sexo. Não acredito nesse súbito amor dela por ele. Fiquei enojada dela e com uma pena enorme de Ravi. Ele não merece cair nas garras de outra doida. Ela vai fazer com ele o mesmo que fez com Mateus. É só Renato aparecer e confessar que é Cristian e que Ravi sempre soube disto que ela chuta Ravi, porque ela é a perfeitinha que não tolera mentiras e os dois mentiram.

Anônimo disse...

Eu ja acho que isso tem a ver com a fuga do publico pelas reprises. Alem da Ilusao é maravilhosa e tá com os mesmos numeros de Nos Tempos do Imperador que era horrivel.

Marcio Silva disse...

Raramente, assisto(só pedaços de cenas)"Quanto Mais Vida Melhor", muito menos "Um Lugar ao Sol", mas percebi algum tempo, que o público de folhetim, não gosta de histórias centralizadas em personagens masculinos, e tramas sem o clássico embate do mocinha x vilã, as novelas "acostumaram"(bem ou mal) o público, a ficar(maioria) "aprisionados" em clichês, poucos autores se libertam, e "enfretam" os espectadores, contando estórias desafiadoras que os deixam "desconfortáveis"(no bom sentido), é ótimo, quando um roteirista mergulha na própria estória, não deixando o público invadir, sua "privacidade criativa", "A Favorita" foi o sucesso que foi, justamente, pela ousadia (mesmo tendo clichês irresistíveis), se a Flora fosse a mocinha como a maioria pensava (queria), João Emmanuel Carneiro não teria escrito uma delícia de vilã, é uma novela inesquecível, não sou contra o clichê, mas histórias com profundidades, o equilíbrio tem que prevalecer kkkkkk!!!!!!!!!!

Reflexos Espelhando Espalhando Amig disse...

Sergio,
Eu adoro a forma como
Você pública falando
de forma completa sobre
a revisão brasileira.
Precisamos de pessoas
assim, que apontam
e registram.
Obrigada de verdade.
Bjins✨
CatiahoAlc.

Adriana Helena disse...

É verdade Sérgio, somente a Globo tem todo esse cuidado com produções de novelas e realmente as duas são de qualidade muito boa!Uma pena que a audiência esteja tão inferior, eu gosto muito de assistir partes de "Quanto Mais Vida Melhor", está incrível o desenvolvimento dos personagens!

Beijos e um excelente restante de semana!!

Maria Rodrigues disse...

Mais uma esclarecedora e brilhante análise.
Abraços

Jovem Jornalista disse...

Análise irretocável! Gostei muito do ponto de vista.

Boa semana!

O JOVEM JORNALISTA está de volta com muitos posts e novidades! Não deixe de conferir!

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Até mais, Emerson Garcia

Sérgio Santos disse...

Verdade, Guilherme.

Sérgio Santos disse...

Bjs, Fatyma!

Sérgio Santos disse...

Tudo bem, anonimo.

Sérgio Santos disse...

Tem razão, Marcio.

Sérgio Santos disse...

Que honra, Catiaoho.

Sérgio Santos disse...

To amando tb, Dri!

Sérgio Santos disse...

Obrigado, Emerson.

JBatista disse...

Qual música é comum nas duas novelas?