quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Início de "Volta por Cima" causa uma boa impressão

 O início da nova novela das sete, escrita por Claudia Souto e dirigida por André Câmara, vem causando uma boa impressão. Ao contrário de vários folhetins recentes, não houve correria no primeiro capítulo de "Volta por Cima" e todos os personagens foram apresentados de forma coesa, com direito a um excelente gancho, que causou tensão e despertou curiosidade para o que aconteceria no dia seguinte. 


A autora acerta ao focar em uma história familiar clássica e com cara de novela, deixando os mistérios e enigmas que tanto abordou no sucesso "Pega Pega" e no fracasso "Cara e Coragem" de lado. A família central conquistou logo de cara e muito por causa da forma delicada de sua apresentação. O motorista Lindomar (MV Bill) acordou cedo para trabalhar. Na sala, sua esposa Doralice (Teresa Seiblitz) fez o café da manhã, enquanto as filhas Madalena (Jéssica Ellen) e Tati (Bia Santana) se preparavam para mais um dia. No sofá da sala, Osmar (Milhem Cortaz), irmão de Doralice, ainda dormia. Era cedo na Vila Cambucá, bairro fictício do subúrbio do Rio de Janeiro, e esse era mais um despertar de uma família que vislumbra por dias melhores.

Uma fatalidade, no entanto, mudou para sempre a vida da família de Madalena. Lindomar estava prestes a se aposentar, mas no seu último dia de trabalho, o motorista sofreu um infarto no volante do ônibus, causando um grave acidente. Tudo poderia ter sido pior se não fosse pela liderança do Jão (Fabrício Boliveira). Amigos na Viação Formosa, Jão decidiu fazer companhia para Lindomar em sua última viagem no ônibus. Madá também acabou no veículo, já que foi ao encontro do pai para lhe entregar o escapulário que ele esquecera em casa. Ainda sentou ao lado de Gigi (Rodrigo Fagundes), integrante de uma família falida que vive de aparências. A sequência final da estreia teve como protagonista o desespero de todos passageiros e os efeitos especiais impressionaram pelo nível de realismo. Ainda mais diante de uma sucessão de acidentes porcamente realizados pelas direções das novelas e também por causa da corte de orçamento da Globo. O exemplo mais recente é "Família é Tudo", folhetim das sete recém-terminado, cujas cenas de ação causaram constrangimento de tão ruins. O que antes era uma rotina na maior emissora do país, acabou virando uma exceção. O ônibus perdendo o controle, batendo na mureta de proteção e depois ficando pendurado no que restou do viaduto da Perimetral resultou em imagens incríveis e fez toda a diferença para o nível de adrenalina daquele momento que iniciou, de fato, a história principal. 

Se antes a relação de Madá e Jão era marcada por constantes desentendimentos e implicâncias, o momento de tensão que viveram juntos pacificou a convivência entre os dois. A verdade é que Jão é um cara gente boa, amigo de todos. Ele bem que sente atração por Madá, embora se irrite com as constantes críticas que recebe dela, o que desperta ainda mais sua curiosidade. Entre Jão e Madá há uma tensão subjacente, que pode esconder sentimentos mais profundos e deixa todos ao redor intrigados sobre o que realmente se passa entre os dois. A moça, porém, não tem o caminho livre, já que vive uma relação duradoura com Chico (Amaury Lorenzo). Outro acerto da trama até o momento: não ter iniciado o romance dos mocinhos logo no começo. 

Aliás, os protagonistas são muito carismáticos e de fácil identificação. A casa de Madalena é como a de muitos brasileiros. O retrato de pessoas que acordam todos os dias para batalhar o presente e construir o futuro guiados por seus valores e sonhos. Madá ainda quer encontrar o seu propósito na vida, mas quando sua mãe descobre uma grave doença no coração, ela passa a ajudar no sustento de casa, vendendo as roupas de ginástica feitas por Doralice e cuidando da irmã adolescente. A história da mocinha começa quando a de seu pai termina. Com a partida de Lindomar, Madá passa a chefiar a casa com coragem e resiliência. Para ela, não há lugar para a tristeza quando se é filha de um cara que tinha tanta alegria na vida.

 A mesma resiliência está em Jorge Correa, conhecido por todos como Jão. Ainda jovem, ele começou a trabalhar na Viação Formosa como trocador de ônibus. Criado apenas pela mãe Neuza (Valdineia Soriano), Jão se habituou desde cedo a ser o responsável pela casa. Sua dedicação na empresa o faz subir de posto, chegando ao cargo de fiscal. E, depois do esforço para conquistar o tão sonhado diploma no curso de Administração, ele passa a almejar um cargo melhor na empresa, mas é preterido pela indicação do melhor amigo da mulher do patrão, Edson Bacelar (Ailton Graça), que tem tudo para ser o seu pai biológico ---- um clichê de todo bom folhetim. Madalenas e Jãos existem aos milhares no Brasil: são pessoas que buscam diariamente uma vida melhor para si e suas famílias e precisam ‘se virar’ diante dos desafios que o destino muitas vezes impõe. 

É preciso citar ainda o núcleo da família falida composta por Belisa (Betty Faria), Joyce (Drica Moraes) e Gigi, três irmãos que não aceitam que mudaram de condição e não fazem mais parte da elite. O trio é cuidado pelo mordomo, motorista e faz-tudo Sebastian (Fábio Lago). É um clichê que costuma funcionar na teledramaturgia e está gostoso de assistir. Outra trama com potencial é a de Roxelle (Isadora Cruz), a amante de Chico (Amaury Lorenzo), noivo de Madalena. É aquela clássica personagem gostosona e desbocada que rouba a cena. 

Vale citar também mais um ponto que contou a favor do início da nova novela: o foco na reação dos personagens com o acidente que vitimou Lindomar. Não cortaram as cenas e nem colocaram uma passagem de tempo inapropriada, o que provocaria uma perda de impacto. Todos acompanharam o resgate das vítimas e a morte do patriarca foi recebida com muita dor por Doralice, Madá, Pati, Osmar, e os amigos da família. Somente depois que houve a inserção de uma passagem de tempo, mas sem uma superação inverossímil. A mocinha surgiu chorando a perda do pai e desabafando com a amiga. Já Osmar se mostrou desesperado com o dinheiro que Lindomar ainda tinha direito por conta das ameaças que sofreu do filho de sua amada, o bicheiro Baixinho (Rodrigo Garcia). E aí que entrou o outro plot do enredo, uma vez que o cunhado descobriu que o falecido apostou na loteria pouco antes do acidente e ganhou uma bolada. O sujeito roubou o bilhete, depositou uma fortuna em uma conta que abriu no banco e tentou quitar a dívida com o filho de Violeta (Isabel Teixeira). No entanto, o vilão seguiu querendo matá-lo. Só que algo inesperado aconteceu: Baixinho forçou a mãe a assinar um acordo de casamento com um bicheiro que é seu aliado como condição para deixar Osmar vivo. Quando tudo parecia resolvido, o vilão não viu o fosso do elevador e caiu. Osmar até tentou segurá-lo, mas não adiantou. A autora arrisca ao eliminar um tipo que tinha tudo para render na trama, até porque foi uma ótima sacada o personagem ser tão parecido com Bernardo Bello, conhecido contraventor do Rio de Janeiro. Mas resta aguardar as cartas que tem na manga. 

"Volta por Cima" é uma trama sobre conquistas e o preço que as pessoas estão dispostas a pagar por elas. É também sobre dinheiro, e se ele pode estar acima dos laços familiares. Criada e escrita por Claudia Souto, a novela tem potencial para conquistar cada vez mais o público com uma história simples e cativante. Basta saber desenvolvê-la bem.

Um comentário:

Pedrita disse...

eu tenho gostado bastante. só tenho dificuldade com o humor do horário. eu adorei que os dois primeiros capítulos eram um dia só. sim, finalmente sem correr demasiadamente o tempo. lembro que acompanhamos no primeiro capítulo quase todo o café da manhã da família. e qd correu uns dias q eu arrepiei, foi só pra não ficar demasiado no luto, mas foram só alguns dias de aceleração. espero q continue boa. não curti a baixada de cabeça do jão, mesmo entendendo q ele precisa do trabalho. não é resilência, é aceitação de violência. beijos, pedrita