terça-feira, 8 de outubro de 2024

Segunda temporada de "Os Outros" se mostrou muito aquém da primeira

 A primeira temporada de "Os Outros" foi um sucesso de público e crítica. Uma das produções mais elogiadas do ano passado. O êxito resultou em uma segunda temporada, que ficou cercada de expectativas e também desconfianças. Afinal, conseguiria manter a excelência da primeira? Havia fôlego para uma continuação? Até porque o último episódio da trama original dividiu opiniões. 


O Globoplay estreou a segunda temporada no dia 15 de agosto e foi liberando dois episódios --- de um total de 12 --- por semana, até a finalização da trama, no dia 12 de setembro. O mistério em torno do sumiço de Marcinho (Antônio Haddad) foi solucionado logo no primeiro episódio da continuação, que deixou de ser ambientada em um condomínio de luxo da Barra da Tijuca e passou a ter como principal locação um condomínio de casas de alto padrão no mesmo bairro. Os prédios saíram de cena e as mansões entraram no lugar. 

A essência da narrativa se manteve, mas aquele clima de extrema tensão no ar deixou de existir e tudo ficou mais subentendido, o que diminuiu a temperatura da série. Não é exagero afirmar que quase todos os episódios são bastante mornos, o que é decepcionante diante da narrativa apresentada na primeira temporada.

Até há um esforço da direção de Luisa Lima em manter um clima de adrenalina constante, mas os acontecimentos não acompanham a trilha sonora. Muitas vezes a música incidental faz parecer que algo acachapante aconteceu, quando na verdade foi algo repleto de absurdos ou sem muito impacto. 

A ideia de Lucas Paraizo em criar uma trilogia utilizando Cibele (Adriana Esteves) e Marcinho como fio condutor é interessante, mas a presença dos personagens na segunda fase se mostra pouco atrativa e só tem densidade nos dois últimos episódios, que são justamente os únicos realmente bons da temporada. Mas até chegar neles é um calvário para o telespectador. Isso porque tudo o que envolve Marcinho na nova saga irrita e nada acrescenta ao roteiro. Qual o intuito do personagem ter virado cúmplice do Sérgio (Eduardo Sterblitch)? Mostrar apenas uma síndrome de Estocolmo? O rapaz ficou dois anos desaparecido e não planejou nada contra o agora vereador em seu retorno? Aliás, o miliciano, sim, deveria ter sido o elo de ligação das temporadas, já que sua mudança para um novo condomínio iniciou um novo caos. 


Mas o outro problema da história foi a superficialidade dos novos personagens. A única boa novidade foi Letícia Colin, que deu um show em cena e aproveitou bem todas as nuances de Raquel, uma pastora com sérios desequilíbrios emocionais. Tanto que ela sustenta a segunda temporada juntamente com todos os personagens que vieram da primeira. Porque se dependesse dos demais o resultado ficaria ainda pior. Nenhum conseguiu provocar interesse ou alguma virada relevante na história. Paulo (Sérgio Guizé), Maria (Mariana Nunes) e Seu Durval (Luis Lobianco) protagonizaram situações bastante controversas e nem mesmo o gato Dudu teve uma trajetória marcante, ao contrário da saudosa cadelinha Gigi.


O vício de Seu Durval em jogo pareceu, com o perdão do trocadilho, jogado de qualquer maneira. O síndico ficou deslocado em boa parte da história e nem mesmo quando virou vítima de Sérgio conseguiu algum destaque. Já a trajetória de Paulo e Maria se mostrou o grande erro da temporada. O fracasso de "Travessia", novela de Glória Perez, já tinha dado o sinal de alerta: algumas tecnologias não funcionam dramaturgicamente. Por mais que o mundo atual esteja cada vez mais moderno, há elementos que não dão certo na ficção, como é o caso dos famigerados óculos de realidade virtual. Foi válida a intenção do autor de querer transformar o clichê do homem que tem um caso extraconjugal em uma traição subjetiva, mas o resultado foi o pior possível. As cenas não se conectavam com a história e eram constrangedoras. Para culminar, o plot twist já na reta final não teve nexo algum. Se Maria culpava Paulo pela morte de seu marido, que mergulhou para salvá-lo e acabou morrendo afogado, qual a lógica de ter se envolvido amorosamente com ele? E por que surtou quando o romance terminou a ponto de ameaçar todo mundo com uma arma? Era uma vingança? Para que a traição virtual se ambos já se conheciam? Por que Paulo ficou com ela? Achou normal a viúva do sujeito que o salvou querer algo com ele? Enfim, nada ali teve coerência.


No entanto, os dois últimos episódios merecem elogios. Aquela tensão da primeira temporada é novamente sentida e a morte de Sérgio, com uma martelada na cabeça, provocou uma boa surpresa, assim como os desdobramentos em torno do crime. A entrada da magnífica Walderez de Barros, interpretando a avó maligna do miliciano, também engrandece a reta final e a veterana deveria ter aparecido desde o início. Sua presença em cena é um presente para o público e o desfecho trágico da personagem é a melhor surpresa da série, além de um implacável castigo do destino. Também é preciso elogiar a solução para o assassinato do maior vilão da trama. Raquel assumir o crime pode até parecer absurdo em um primeiro momento, mas se mostrou condizente com a personagem. A fanática religiosa enxergou aquilo como uma oportunidade divina para se punir por ter engravidado de Sérgio. Ou seja, ela não fez aquilo por Cibele e, sim, para 'ajoelhar no milho' e só depois ter a sua redenção ao lado do marido e do futuro filho. Uma sacada criativa do autor para manter Cibele e Marcinho livres.

"Os Outros" teve um vitorioso ciclo em 2023, mas a segunda temporada se mostrou muito aquém da primeira em 2024. Caso haja mesmo uma nova saga, é preciso que Lucas Paraizo pense bem no que fará, já que o escritor adiantou que a terceira temporada terá como ambiente o campo e com vizinhos bem mais humildes. É lá que Cibele e Marcinho ficarão? Será que vale a pena manter os personagens durante uma nova leva de episódios? Ainda há conflitos para eles? Resta aguardar e torcer para que a trama volte a ter a qualidade de antes. Competência, o autor já mostrou que tem de sobra.

4 comentários:

chica disse...

Crítica muito bem feita! Concordo! abração, chica

Unknown disse...

Nem perdi meu tempo com isso e Justiça 2. Tava na cara que não iam manter a qualidade!

Adriana Helena disse...

Puxa que pena Sérgio!!
Eu assisti a primeira temporada e adorei!
Mas com a sua perfeita descrição da segunda temporada ter sido monótona, creio que não irei assistir por enquanto...Mas a ideia é boa!!!
Abraços querido amigo!!!

citu disse...

Genial