terça-feira, 5 de outubro de 2021

"Dom" é uma ótima série da Amazon Prime Video

 A primeira série original brasileira da Amazon Prime Video foi uma grata surpresa. O serviço de streaming produziu com muita qualidade a história, baseada em fatos reais, de Pedro Dantas, jovem de classe média que se torna um dos bandidos mais perigosos do Rio de Janeiro e ganha o apelido de Pedro Dom. Como é um tipo bonito fisicamente, utiliza a imagem a seu favor e vira um chefe de quadrilha que aterroriza a classe alta da cidade nos anos 2000. Criada por Breno Silveira, a trama tem Gabriel Leone interpretando o protagonista e apresenta oito episódios muito bem desdobrados. 

"Dom" tem um formato inicialmente confuso, mas que logo se estabelece de forma mais clara para o telespectador. Há três narrativas quase simultâneas: a da infância de Pedro Dantas, a transformação do jovem rebelde em bandido e o passado do pai de Dom, Victor Dantas, vivido por Flávio Tolezani. Ironicamente, a história mais interessante é a do pai do protagonista. A principal razão é o tom 'novelesco' dado para o homem que era mergulhador e se viu no meio de uma guerra entre policiais e traficantes.

A filha de Victor, irmã de Dom, Érika Grandinetti, deu uma declaração sobre a dor que vem sentindo diante da história contada pela série. Isso porque, segundo ela, o pai retratado da obra nunca existiu. A família está até processando a Amazon Prime Vídeo.

A mãe do bandido (Nídia Sarmento), baleado e morto em 2005, também demonstra revolta pela produção. Mas nem era necessária a revelação de Érika. Quem viu a trama percebeu o tom fantasioso em torno do pai de Pedro Dom. 

O cineasta Breno Silveira nunca escondeu que ouviu de Victor a sugestão para contar a vida do filho. Ou seja, ouviu a narrativa vinda do pai. Quando procurou a mãe e a filha para ouvir a versão delas, acabou ignorado. Então, sem o outro lado, resolveu transformar o pai em um quase heroi da Marvel. Isso fica mais explícito quando o 'personagem', policial fora da ativa, invade o morro Dona Marta para buscar o filho e não é assassinado pelos traficantes só porque enfrenta todos falando grosso. Quem é carioca sabe que isso não existe.

Só que a opção por uma narrativa voltada aos elementos clássicos de uma boa ficção foi um acerto. Até porque é preciso lembrar que a série não é um documentário, apenas baseada em fatos reais. E todo formato do gênero vai, sim, utilizar uma boa dose de ficção para prender o telespectador. É justamente essa ficção que promove as maiores catarses da série e vale elogiar o desempenho de Flávio Tolezani na pele do personagem mais velho e de Filipe Bragança como Victor jovem. Aliás, todo o envolvimento do rapaz com o mundo do tráfico é muito bem explorado. A ponto de quem assiste sentir até uma certa empatia pelos traficantes. Fábio Lago e Hilton de Castro estão perfeitos como chefe do morro, Ribeiro, e o dono do bar, Nerinho, respectivamente. Outro ponto que desperta atenção é a ótima abordagem da podridão que acomete boa parte da polícia militar e civil do Rio de Janeiro. 

Toda a construção em torno do 'nascimento' de Pedro Dom também merece menção. Através da amizade entre Pedro (Guilherme Garcia) e Rico (MC Caveirinha) é possível ver como a droga vai destruindo a vida das famílias, sendo elas ricas ou pobres. A maior diferença é que o pobre morre primeiro porque não tem o suporte, emocional e financeiro, que o rico tem. O laço afetivo que une as crianças emociona ao mesmo tempo que expõe o início do vício em cocaína. Já adultos, vividos por Gabriel Leone e Ramon Francisco, os dois seguem unidos, mas o vício segue como o ponto fraco do elo, que resulta no rompimento do vínculo e um fim trágico. O desfecho triste da amizade se dá pouco tempo depois que a quadrilha é formada. Aí vem a questão: isso realmente ocorreu ou foi apenas um elemento ficcional? Pouco importa. Funcionou para a narrativa. 

Aliás, o time de criminosos é muito bem interpretado. Gabriel se firma como um dos melhores atores de sua geração e sua entrega na pele do protagonista impressiona. O ator consegue aproveitar as pequenas nuances do personagem e o humaniza com competência. Isabella Santoni surpreende na pele da sensual Viviane. Não é exagero afirmar que é sua melhor atuação até agora. A patricinha representa a tentação e a perdição. É quase uma espécie de diabo que utiliza as fraquezas dos outros para se beneficiar. Raquel Villar, intérprete da ambiciosa Jasmim, é outro bom nome, assim como o já mencionado Ramon Francisco. Digão Ribeiro está ótimo como o traficante Armário e vale aplaudir ainda a grande Laila Garin na pele de Marisa, mãe de Dom, e Mariana Cerrone como Laura, irmã de Dom. Wilson Rabelo também brilha como Arcanjo, todo poderoso das forças armadas que coloca Victor Dantas para ser um policial. Já Júlia Konrad tem uma breve, mas boa, participação como a investigadora Paloma. 

"Dom" tem feito por merecer os elogios e uma segunda temporada já está confirmada. Isso porque a série teve um final inteligente. Todos sabem que o protagonista é assassinado pela polícia em 2005, mas a última cena foi realizada de uma forma dúbia, dando brecha para uma sobrevida da trama, que ganhou a continuação em virtude do sucesso. 

22 comentários:

Max disse...

Eu assisti há algum tempo e gostei muito. Foi a série que me mais me prendeu até agora no ano de 2021, fato que vem sendo quebrado apenas pela ecelente Round 6 da Netflix.

Mas enfim, achei tudo perfeito. Enredo, construção da narrativa (três linhas do tempo que deram super certo), caracterização, cenografia da época (que mata de vergonha novelas como Boogie Oogie Verão 90), atuações impecáveis (finalmente a Raquel Villar vai ficar sendo lembrada por uma boa atuação após um dos piores papéis de Amor à Vida), enfim. Parecia que eles estavam usando drogas de verdade. E Isabela Sartoni cresceu muito nesse papel, merece inclusive voltar às novelas no papel de uma grande vilã.

Enfim. Obrigado por compartilhar sua coerente análise conosco.

Fernanda disse...

Eu adorei a série e até queria perguntar se voce ia escrever sobre. Assino embaixo do texto.

chica disse...

Vim me informar e deixo o meu abração! tudo de bom,lindo dia! chica

Teresa Isabel Silva disse...

Já ouvi falar, mas ainda não tive a oportunidade de ver!

Bjxxx
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Adriana Helena disse...

Puxa Sérgio, realmente não conhecia a série e fiquei muito impressionada com a sua narração sore esse trabalho que parece ser incrível!!
Se tem Gabriel Leone com certeza é muito bom, pois ele é talentosíssimo!!
Vou assistir!!
Grata pelas informações!
Tenha uma linda semana!! :))))

Ane disse...

Oi Sergio! Vim conhecer seu blog e já gostei.
Agradeço pela visita e comentário no meu cantinho.
Eu não tenho a Amazon, mas me parece uma bela série!


Boa continuação de semana!
Ane :-D
De Outro Mundo

Maria Rodrigues disse...

Parece ser uma série muito interessante.
Abraços

Jovem Jornalista disse...

Não conhecia a série ainda. Vou adicioná-la aqui!

Boa semana!


Jovem Jornalista
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Até mais, Emerson Garcia

Artes e escritas disse...

Eu praticamente não assito televisão, mas tenho algo a dizer em acordo com as aulas que frequentei, durante as quais aprendeu-se que Lutero era demasiado mau para com os jovens, e neste detalhe aconselhou aos mais velhos a não aconselharem os jovens em demasia, e seguindo o aprendizado, e pertencendo ao grupo dos idosos, abstenho-me de comentar, deixando para que pais e filhos se resolvam da mameira que lhes convenha, não interferindo na célula familiar composta por pai, mãe e filhos. Um abraço, Yayá.

Inês disse...

Não conhecia, mas fiquei com vontade de ver! :)
--
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Sérgio Santos disse...

Eu tb achei mt boa, Max. Eu que agradeço.

Sérgio Santos disse...

Que bom, Fernanda.

Sérgio Santos disse...

Veja, Teresa.

Sérgio Santos disse...

Bjs, Chica.

Sérgio Santos disse...

É mt boa, Dri! bjs

Sérgio Santos disse...

Que honra, Ane. bjssss

Sérgio Santos disse...

É sim, Maria.

Sérgio Santos disse...

Vale a pena, Emerson.

Sérgio Santos disse...

Ok, Yayá.

Sérgio Santos disse...

É ótima, Inês.

Outsiders disse...

É tão fascinante que a gente até esquece da lente azul horrorosa do Gabriel Leone

Há muitos anos qualquer um que tenha convivio proximo dos morros cariocas comandados pelo CV ou que tenha familiaridade com o Funk raiz já conhecia a historia pessoal da lenda que se criou em torno de Pedro Dom. Centenas de musicas em sua homenagem mostram que a escalada de violencia o transformou em um mito dos morros. A série tem um ótimo desenvolvimento de personagens, entre os melhores já escritos no Brasil para uma série, passeia entre a vida na infancia, adolescencia e adulta de forma bem coesa. A questão de romantizarem o personagem é uma coisa normal, é uma técnica de roteiro já que alguem tem que ser o anti herói, tem que esbanjar simpatia pra gerar a empatia do público e nesse tipo de historia é necessario já que todos estão do lado errado, vemos isso em diversas produções (Taxi Driver, Bené em Cidade de Deus, DiCaprio em Diamante de Sangue e Diario de um adolescente e etc...) até pq a série é baseada no livro escrito pelo pai do Dom que tem uma visão paternal do assaltante. As pessoas criticam um artifício de roteiro e fecham os olhos pro principal escopo dessa história que é o fato de como a cocaína transformou um menino de familia estruturada e de classe média num assaltante de casas de luxo. Como a cocaína afeta todos em volta e respinga na sociedade independente da classe social. Os ricos que dão seus tirinhos nas noitadas tambem sustentam a invasão desregulada da policia nas favelas e o banho de sangue pobre e favelado que fica no chão. Achei a série de uma urgência necessária e a melhor nacional do ano até agora

Os melhores lances foi a cena inicial e a cena em que a mãe do Lico fala que “o Lico não teve oportunidade de estudar, não teve pai e cresceu no morro, qual a desculpa do Pedro?” foi CERTEIRA!

Que Série Top, a Amazon vem dando um banho na Netflix no quesito qualidade. Um conjunto de interpretações convincentes, ótima direção e produção. Vale muito a pena dar uma conferida. (Tirando a lente azul do protagonista que eu achei péssima.)

Sérgio Santos disse...

Assino embaixo, Outsiders.