O folhetim tem uma estrutura que não pode sofrer muitas modificações. E mesmo com a 'fórmula' conhecida por todos, não é fácil conquistar o público. Não por acaso, não existe uma receita exata para o sucesso. E uma das maiores dificuldades que os autores têm é a criação de um atrativo casal principal. Os chamados mocinhos viraram dor de cabeça para grande parte dos escritores. É bem mais simples criar vilões que roubam a cena do que um par romântico que empolgue. Mas Rosane Svartman não enfrentou esse problema em nenhuma novela sua e não é diferente com "Vai na Fé".
Sol (Sheron Menezzes) e Ben (Samuel de Assis) formam um casal que reúne tudo o que bons protagonistas necessitam: sintonia, química, conflitos e construção. A autora ousou na apresentação do relacionamento dos personagens quando optou pela narrativa de passado e presente caminhando juntos. Não é uma novidade na teledramaturgia, mas o grande público está mais acostumado a acompanhar o estilo em séries, como a aclamada "This is Us".
A história dos mocinhos de "Vai na Fé" não se deu com um amor súbito no primeiro capítulo, como vem ocorrendo nas novelas recentes, o tem prejudicado tanto a aceitação dos casais. Os personagens foram separados no passado por conta de armações e de um crime praticado por Theo (Matheus Polis/Emílio Dantas). Sol achou que tinha sido abandonada por Ben e acabou vítima de um estupro cometido pelo vilão, que a embebedou e se aproveitou daquele momento de fragilidade emocional.
A cena do abuso ainda não foi exibida, mas fica sempre implícita quando a recordação surge. No entanto, os vários momentos românticos dos protagonistas são exibidos através de lindas cenas protagonizadas por Jê Soares e Isacque Lopes. Um detalhe importante: todos inéditos, ao contrário do que costuma ocorrer quando folhetins utilizam o recurso do flashback.A química é visível tanto no passado quanto no presente graças ao entrosamento dos atores, muito bem escalados, e ao roteiro desenvolvido sem correria. É verdade que o público nas redes sociais reclama constantemente na demora da aproximação de Ben e Sol. Porém, a 'indignação' apenas comprova como a estratégia da autora funcionou. Até porque o comum é o telespectador ficar ansioso para que os vilões sejam desmascarados ou ocorra alguma virada na história, mas ansiedade por beijo de mocinhos é algo bem raro. E o casal só protagonizou beijos nas sequências de vinte anos atrás. Já nos dias atuais, ou seja, com Samuel de Assis e Sheron Menezzes, o máximo que acontecia era uma intensa troca de olhares, onde a temperatura elevada ficava quase palpável. Dava para cortar o clima com uma faca. E isso que manteve o par vivo desde o início da história.
No entanto, uma crítica é necessária sobre a trajetória da mocinha: houve um excesso de tempo em cima do namoro de Sol e Lui (José Loreto), que tirou o destaque da personagem por um determinado período. Algo semelhante aconteceu com Eliza (Marina Ruy Barbosa) e Arthur (Fábio Assunção) em "Totalmente Demais", história que Rosane escreveu com Paulo Halm em 2016. Ao menos desta vez não precisou esperar o último capítulo para a junção do par. Isso porque o beijo de Ben e Sol veio nesta terça-feira (13/06), ironicamente um dia depois da celebração do Dia dos Namorados no Brasil. A cena em que ambos se lambuzam de espuma por conta de um problema na máquina de lavar, o que promove a memória de uma situação parecida que o casal protagonizou no baile funk, onde Sol era considerada a princesinha, foi típica de filmes de comédia romântica. Todos os clichês estavam ali. E a química vista entre Samuel e Sheron desde o começo da novela foi finalmente comprovada e apreciada pelo público, ao som de "Garota Nota 100", música de MC Marcinho, tocada nas cenas do passado, e cantada por Ludmilla no presente.
O período em que Ben e Sol ficaram separados não causou aquela sensação de enrolação porque vários outros conflitos eram desenvolvidos, incluindo os vivenciados pelos protagonistas. Ben teve a crise até o término de seu casamento com Lumiar (Carolina Dieckmann) exposto, enquanto Sol encarou uma avalanche de problemas quando seu então marido, Carlão (Che Moais), faleceu em um acidente de carro. O reencontro se deu justamente por conta da tragédia, onde as feridas do passado acabaram revividas e uma reaproximação se tornou inevitável. Rosane fez com que o casal praticamente se conhecesse de novo, sem o esquecimento do passado e com a chance de amenizar os traumas vividos através da luta por justiça. Tudo muito bem estruturado a ponto da expectativa pelo beijo crescer a cada semana.
Há mais um ponto de extrema importância em torno do planejamento da relação dos mocinhos. Os dois formam o primeiro casal central de protagonistas negros em uma novela na Globo. Isso porque as poucas tramas que tiveram um par negro também apresentaram um casal branco para dividir o protagonismo. A primorosa "Lado a Lado", de 2013, teve Lázaro Ramos e Camila Pitanga, mas formavam um quarteto com Marjorie Estiano e Thiago Fragoso. Já na recente e fraca "Cara e Coragem" os mocinhos eram interpretados por Paolla Oliveira e Marcelo Serrado. O casal formado por Taís Araújo e Paulo Lessa não tinha nem metade do destaque do outro e estava mais para coadjuvante, até porque a personagem de Taís passou quase a novela toda dada como morta. Ou seja, Rosane não podia correr o risco de fracassar com os mocinhos de sua trama. A representatividade de Ben e Sol tinha que ser honrada com uma boa construção. E foi.
"Vai na Fé" segue empolgante e a história ter como casal principal dois personagens tão carismáticos e bem defendidos quanto Ben e Sol é uma das várias qualidades do atual folhetim das sete. Samuel de Assis e Sheron Menezzes honram o protagonismo interpretando um casal apaixonante e que merece todo o sucesso que vem fazendo.
Sérgio, texto perfeito, como sempre. Vai na fé demonstra que os protagonistas, mocinhos, não precisam ser chatos. Ben e Sol funcionam tanto separados, quanto juntos. Um casal incrível, uma novela perfeita.
ResponderExcluirVocê foi perfeito. As poucas pessoas que querem ela e Lui nao se tocam da importância de pela primeira vez na história da teledramaturgia termos um casal negro e sem o apoio de um casal branco dividindo o protagonismo. A história é construída com maestria e a química deles é incrível. Eu to amando e amei mais ainda a demora no beijo. Na novela das seis aqueles dois chatos já se apaixonaram na estreia e tão juntos até hoje. O resultado foi a perda da relevância deles em Amor Perfeito.
ResponderExcluiros dois são muito lindos. mas ben fazia um belo par com lumiar tb. eu torço mais pra sol ficar com lui. beijos, pedrita
ResponderExcluirFAZIA TEMPO QUE NAO TORCIA TANTO PELOS MOCINHOS!
ResponderExcluirAi, que delícia essa sucessão de textos escritos por você sobre "Vai Na Fé", Sérgio. Afinal, o que é esmerado no conjunto geral é de fato algo digno de apreço. A demora para o romance de Sol (Sheron Menezzes) e Ben (Samuel de Assis) nos dias atuais valeu demais a pena, principalmente com o cuidado na utilização do recurso do flashback, que funciona como um quebra-cabeças e contribui bastante para a excelente compreensão da história. Usando alguns de seus bordões, Sérgio, posso dizer com convicção: "Pode elogiar 'Vai Na Fé'? Pode." e "Nunca é demais elogiar 'Vai Na Fé'.".
ResponderExcluirGuilherme
Estou torcendo por eles. E os motivos são vários. Também aplaudi a inclusão da questão do estupro, resultante do embebedamento da personagem. Temos visto, nesses últimos tempos, que embebedar-dopar, vulnerabilizar uma pessoa, de algum modo, para praticar com ela sexo não consentido, tem sido considerado um tipo de "esporte", perpetrado por gente sem noção (pra dizer o mínimo).
ResponderExcluirBeijo e bom fim de semana
Olá, tudo bem? Concordo. A autora soube conduzir a história do casal Sol e Ben durante toda a trama, bem diferente do que aconteceu em Amor Perfeito... Abs, Fabio www.blogfabiotv.blogspot.com.br
ResponderExcluirMais uma bela análise de uma boa novela !
ResponderExcluirGostei de ler!
Ane/De Outro Mundo 🏡
Sérgio, um dia constatei o fato de haver alguns momentos piegas e ao mesmo tempo fofinhos em folhetins. Não fosse pela correria na narrativa, "Amor Perfeito" poderia ter rendido um deles com louvor. Esta cena que mencionarei teria sido melhor inserida após cerca de dois ou três meses de exibição da novela, e não em seu trigésimo capítulo. Mais especificamente, ela retratava um momento em que Marê (Camila Queiroz), após tanto tempo junto a Orlando (Diogo Almeida) apenas para descobrir o paradeiro de Marcelino (Levi Assaf), sugere a Orlando que ambos estão voltando a se envolver romanticamente, e Orlando, radiante, exclama: "A mulher que eu amo voltou para mim!". Já os de Sol (Sheron Menezzes) e Ben (Samuel de Assis) em "Vai Na Fé" nos derretem por completo com uma consistente estruturação da história de amor de ambos.
ResponderExcluirGuilherme
Aí vai outra constatação, Sérgio. (Risos) Quando se encontram novelas com potencial para fazer sucesso e encantar do início ao fim, ao se lerem os resumos dos capítulos a serem exibidos dentro de duas semanas, não é gostosa a sensação de vislumbrar o conteúdo lido, pensar em como será quando determinadas cenas forem veiculadas na televisão, e na semana exata de exibição comprovar a sensação relatada?
ResponderExcluirGuilherme
Sérgio, sabe aquela meiga cena recentemente exibida em "Vai Na Fé" de Sol (Sheron Menezzes) cantando e Ben (Samuel de Assis) falando breves frases repletas de afeto? O recurso dessa cena parece ter uma estrutura que lembra a de trechos da canção "One Sweet Day", da Mariah Carey (minha cantora preferida) em parceria com o grupo Boyz II Men, ou de uma cena do primeiro filme da franquia "High School Musical" em que ocorriam audições com a canção "What I've Been Looking For". É tão bom quando as produções dramatúrgicas dos mais variados formatos conversam entre si em diversos aspectos, não é mesmo?
ResponderExcluirGuilherme
É isso, Lois.
ResponderExcluirConcordo 100%, Andressa.
ResponderExcluirSem problemas, Pedrita. bjssss
ResponderExcluirEu tb, anonimo.
ResponderExcluirFico honrado demais, Guilherme. Mt obrigado e desculpa a demora na resposta.
ResponderExcluirPerfeito, Marly!
ResponderExcluirExato, Fabio.
ResponderExcluirFico feliz, Ane.
ResponderExcluirExcelente observação, Guilherme. E agora fica visível como Amor Perfeito nao tem mais enredo pra contar.
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