Nada pior para uma novela do que uma mocinha idiota. O excesso de ingenuidade de uma protagonista funcionava há mais de 30 anos, mas tem muito tempo que a fórmula da burrice utilizada para o roteiro andar não é mais aceita pelo público. E João Emanuel Carneiro soube construir Maíra com várias nuances que deixam clara a esperteza da personagem brilhantemente vivida por Sophie Charlotte em "Todas as Flores".
Vale lembrar que os dois maiores fracassos do autor se deram com folhetins onde as mocinhas eram exageradamente burras. Em "A Regra do Jogo" e "Segundo Sol" era impossível o telespectador sentir qualquer empatia por Toia (Vanessa Giácomo) e Luzia (Giovanna Antonelli), respectivamente. Claro que as tramas foram um fiasco pelo conjunto da obra e não por culpa exclusivamente das protagonistas, mas não deixa de ser uma observação relevante. Até porque João também criou protagonistas que eram inteligentes e davam a volta por cima, como Preta ("Da Cor do Pecado"), Donatela ("A Favorita") e Nina ("Avenida Brasil") ---- ok, a questão do pendrive foi um acidente de percurso.
Maíra reúne as melhores características das mocinhas mais queridas do autor. A perfumista deficiente visual nunca foi boboca. E a esperteza da protagonista sempre foi mostrada de forma sutil. Mesmo sem declarar abertamente, ficava claro que a personagem nunca acreditava 100% em Zoé (Regia Casé) e principalmente Vanessa (Letícia Colin).