sexta-feira, 20 de novembro de 2020

"Falas Negras" foi um especial forte, emocionante e essencial

 Em um ano atípico, marcado pela pandemia do novo coronavírus, foram poucas as produções inéditas na televisão. As reprises vêm dominando a programação dos canais. Abertos ou fechados. No entanto, a Globo surpreendeu e conseguiu produzir um importante especial, exibido nesta sexta-feira (20/11), Dia da Consciência Negra: o "Falas Negras". 


Idealizado por Manuela Dias, autora de "Amor de Mãe", o projeto é dirigido por Lázaro Ramos e traz 22 atores interpretando falas históricas, todas em primeira pessoa. A equipe ainda criou um baobá (símbolo da África) de proporções reais para o cenário ---- com cinco metros de altura e a copa de seis metros de diâmetro. Foram dez dias de ensaio e preparação de elenco, tudo feito de forma remota. 

A preparadora foi a atriz Tatiana Tibúrcio, que também atuou no episódio como Mirtes Souza, mãe do menino Miguel, morto depois de ser deixado sozinho dentro de um elevador por Sarí Corte Real, patroa de Mirtes. Que atuação dilacerante. Que show! Todos que participaram da produção são negros, com exceção da idealizadora Manuela. Thaís Fragozo esteve na pesquisa, enquanto a antropóloga Aline Maia foi consultora do projeto. São 22 depoimentos reais de pessoas que lutaram contra o racismo, a favor da justiça e da liberdade. 

Além da já mencionada Tatiana, o elenco ainda conta com Fabrício Boliveira, Babu Santana, Guilherme Silva, Ivy Souza, Naruna Costa, Taís Araújo, Heloísa Jorge, Bárbara Reis, Mariana Nunes, Izak Dahora, Silvio Guindane, Olívia Araújo, Reinaldo Júnior, Aline Deluna, Flávio Bauraqui, Bukassa Kabengele, Angelo Flavio, Samuel Melo, Aílton Graça, Tulanih Pereira e Valdineia Soriano. E todos estão brilhantes. Cada um protagoniza um breve monólogo através da representação de um depoimento. A força das palavras e a emoção dos intérpretes são a maior força do especial.  

Naruna Costa representou Angela Davis, nascida em 1944, uma das maiores ativistas e abolicionistas negras dos Estados Unidos. Heloísa Jorge foi Nzinga Mbandi, nascida em 1582, em Angola, e rainha do Reino do Dongo e Matamba. Aline Deluna viveu Virgínia Leona Bicudo, a primeira psicanalista brasileira e cofundadora da Sociedade Brasileira de Psicanálise, neta de uma escrava alforriada (1910/2003). Já Taís Araújo foi a escolhida para representar Marielle Franco, ativista dos direitos humanos e defensora das mulheres, brutalmente assassinada em 2018 em um crime ainda sem solução. Sem dúvida um dos momentos mais fortes da produção. Angelo Flávio viveu James Baldwin (1924/1987), escritor, dramaturgo, crítico social e poeta. Valdineia Soriano deu vida a Luiza Barrios (1953/2016), administradora e cientista social, nascida em Porto Alegre, um dos nomes mais atuantes do Movimento Negro. Silvio Guindane interpretou Neilton Matos Pinto, pai do adolescente João Pedro Matos Pinto, assassinado na favela do Salgueiro, em São Gonçalo, Rio de Janeiro.

Ailton Graça interpretou Milton Santos, um dos maiores geógrafos brasileiros (1926/2001) com mais de 40 livros publicados em sete línguas. Bukassa Kabengele representou Nelson Mandela, presidente da África do Sul, que liderou o movimento contra o Apartheid, o conhecido regime de segregação racial implantado no país na época. Ivy Souza viveu a musicista e cantora Eunice Kathleen Waymon, Nina Simone, uma grande ativista falecida em 2003. Izak Dahora honrou a memória de Toussaint Louverture (1743/1803), considerado o líder da Revolução Haitiana; enquanto Guilherme Silva reviveu Martin Luther King (1929/1968), grande nome dos movimentos civis nos Estados Unidos, na luta pela igualdade entre negros e brancos. Fabrício Boliveira interpretou Olaudah Equiano (1745/1797), escritor nigeriano que foi sequestrado e escravizado aos 11 anos. Flávio Bauraqui viveu Luiz Gama (1830/1882), importante líder abolicionista e poeta brasileiro. 

Samuel Melo interpretou Malcolm X (1925/1965), ativista dos direitos civis nos Estados Unidos. Mariana Nunes viveu Lélia Gonzalez (1935/1994), antropóloga, historiadora e professora. Olívia Araújo representou Harriet Tubman (1820/1913), ex-escravizada que ajudou na fuga de centenas de escravos durante a Guerra Civil Americana. Reinaldo Júnior interpretou Mahomah G. Baquaqua (1820/1857), nascido na África Ocidental, vindo de um navio negreiro que aportou em Pernambuco, cuja biografia foi escrita em Detroit, Estados Unidos, anos depois de sua fuga. Babu Santana esteve na pele de Muhammad Ali (1942/2016), nascido nos Estados Unidos e maior pugilista da História. Bárbara Reis viveu Rosa Parks (1913/2005), considerada a "mãe do moderno movimento dos direitos civis". Já Tulanih Pereira representou todos os jovens que participaram dos protestos contra a violenta morte de George Floyd, nos Estados Unidos. 

"Falas Negras" foi um especial forte, bem idealizado, emocionante e brilhantemente interpretado. Além de essencial. 

15 comentários:

  1. Uma grata surpresa! Não esperava ser tão bom!

    ResponderExcluir
  2. O maior acerto da programação da Rede Globo neste ano de 2020, e exibido no dia ideal, é assim que podemos descrever "Falas Negras", que primou principalmente pela representatividade e mostrou que vidas negras importam.

    Guilherme

    ResponderExcluir
  3. Confesso que por saber que seria tão forte, ontem não consegui ver...Aqui em P.Alegre foi dia de comoção pelo acontecido num supermercado.,Uma barbárie.Por isso, precisava coisa leves! Mas vou tentar ver! abraços, chica

    ResponderExcluir
  4. Não conheço, não sei se passará em Portugal mas fiquei curiosa.
    Gostei do blogue, já me tornei seguidora para não perder nada 😁
    Beijinhos

    ResponderExcluir
  5. Olá, primeira vez que comento no seu blog!
    Especial de alta qualidade, sobre um tema que precisa ser discutido no Brasil, apesar daqueles que continuam afirmando que no nosso país não existe racismo.
    Falas Negras também demonstrou o potencial de atores e atrizes da raça negra que, infelizmente, não têm grandes oportunidades na tv.

    Grande abraço!

    ResponderExcluir
  6. Olá, tudo bem? A TV Globo tem uma dívida enorme com os atores afrodescendentes... Abs, Fabio www.blogfabiotv.blogspot.com.br

    ResponderExcluir
  7. Foi um show, Sérgio! Magnífico! E você, sempre completo em suas postagens. Abraço.

    ResponderExcluir
  8. Então não falam depois que você não curte de Manuela Dias.

    ResponderExcluir
  9. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

    ResponderExcluir
  10. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

    ResponderExcluir
  11. Olá, estimado Sérgio!

    Mesmo sendo portuguesa, parece que assisti daqui. Deve ter sido um espetáculo fabuloso e que fez vibrar atores, atrizes e público em geral. A Globo está de parabéns, então.

    Beijo, querido amigo!

    ResponderExcluir
  12. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  13. Não assisti Sérgio, mas gostaria que a Globo desse mais oportunidade aos artistas negros em suas produções. Quase não vemos protagonistas nas novelas, séries e filmes que sejam negros. Um absurdo!
    Existem tantos talentos.
    Big Beijos,
    Lulu on the sky

    ResponderExcluir