Entretanto, uns pequenos tropeços de "Totalmente Demais" merecem ser citados e comparados com "Bom Sucesso". A passividade de Jonatas, por exemplo, é algo que incomoda em vários momentos. O mocinho caiu nas graças do público e o casal "Joliza" foi um marco da trama.
Felipe Simas viveu seu melhor momento na carreira até então e sua química com Marina Ruy Barbosa era avassaladora. Mas o garoto passou a novela toda praticamente em função da sua 'ruivinha'. Mesmo depois de ter sido dispensado pela menina por conta de uma armação de Arthur e Stelinha (Glória Menezes). A falta de amor próprio deveria ter sido visto pelos autores, assim como um enredo para chamar de seu.
A longa duração do término do par principal também é um fato que merece menção. Como ficaram juntos ainda no primeiro mês de novela, a separação se deu pouco tempo depois e os mocinhos ficaram quase a história toda separados, tendo apenas breves momentos de união. O intuito era criar um certo mistério sobre o futuro amoroso da protagonista. Afinal, Eliza teve um romance com Arthur a partir da metade da trama. A pergunta envolvendo o último capítulo não era a famigerada "Quem matou?" e, sim, "Quem vai ficar com a mocinha?". O resultado foi um suspense até o último capítulo, com direito a várias cenas de Arthur dando em cima da modelo e a mocinha fingindo não perceber. Se irritar com a sonsice da protagonista era inevitável. Mas não precisava. O telespectador mais atento já sabia que Jonatas seria o escolhido porque o roteiro foi muito bem estruturado pelos autores. O ex-empresário das ruas sempre foi o amor da ex-florista, assim como Carolina era a paixão de Arthur. Justamente em virtude do bom desenvolvimento da história, o enigma não era necessário. A audiência não cairia.
A pouca relevância do núcleo esportivo escolar da novela é mais uma situação interessante para um comparativo. Montanha (Toni Garrido) era um ótimo professor de Educação Física, mas o colégio pouco aparecia, assim como seus alunos. O núcleo ainda era deslocado dos demais. Algumas vezes não apresentava muitos acontecimentos. A trajetória linda de superação de Wesley (Juan Paiva) ajudou a camuflar um pouco isso. E o romance de Montanha com Rosângela foi atrativo, mas o desfecho se mostrou decepcionante, repetindo um dos bordões de Florisval (Ailton Graça). A mãe de Jonatas voltou para o ex-marido malandro que não pagava pensão e a traía na época de "casados". E a namorada de Florisval acabou ficando com o professor. Uma 'recompensa' não muito digna para Maristela (Aline Fanju), uma mulher que transbordava machismo e no final bancou a santa só pra arrumar um novo pretendente (como se fosse um quesito indispensável para deixar de ser solteira). Aliás, o contexto dessa situação específica era machista: as duas viviam se estapeando por um sujeito que não valia grande coisa. Outro conflito questionável, em um núcleo distinto, era a forma subserviente de Lu (Ju Trevisol) em relação a Rafael (Daniel Rocha) nos meses iniciais de novela.
A trajetória de Gilda (Leona Cavalli) é mais um ponto interessante para analisar. A mãe de Eliza sempre ignorou os assédios e a tentativa de estupro que a filha sofreu do padrasto. Infelizmente, é uma realidade muito comum na sociedade. Há várias Gildas por aí. Mas nem depois que acordou para a monstruosidade do marido e ajudou Eliza a depor contra ele, houve uma evolução de fato. A personagem voltou a ajudar Dino (Paulo Rocha) na reta final com o pretexto de não deixá-lo morrer na cadeia. Para culminar, ainda foi racista ao demitir Riscado (Cadu Paschoal) por conta do sumiço do dinheiro de seu bar ("Flor do Lácio") --- quando o culpado era Carlinhos (Kaik Brum), seu filho. Ela merecia mesmo um final feliz com o milionário Hugo (Orã Figueiredo)? Aliás, Hugo, o homem mais íntegro da história, merecia terminar com essa mulher ao seu lado?
E todas essas situações citadas, que não afetaram a qualidade do conjunto de "Totalmente Demais", foram corrigidas em "Bom Sucesso". Marcos (Rômulo Estrela) se mostrou um mocinho ativo, debochado e tinha vários dramas familiares importantes. Seu amor por Paloma (Grazi Massafera) serviu como um desarme diante de um sentimento verdadeiro. O típico galinha que fugia de relações estáveis se deparou com a estabilidade até então impensável. E a construção dos mocinhos foi bem mais longa, o que proporcionou uma expectativa cada vez mais alta e uma duração maior quando o romance finalmente se estabeleceu. O equívoco do relacionamento entre Eliza e Arthur poderia se repetir com Paloma e Alberto (Antônio Fagundes), mas os autores fugiram da repetição. O pai de Marcos até se apaixonou pela mocinha, mas a personagem nunca soube desse sentimento e o forte vínculo de amizade virou o grande trunfo do enredo. Também não houve uma forçação em torno da decisão de Paloma sobre com quem iria ficar no final. Sua relação com o ex-marido Ramon (David Júnior) foi muito bem resolvida e a parceria se mostrou outro acerto.
É preciso mencionar também o destaque muito maior do núcleo escolar, incluindo a parte esportiva através das aulas de basquete dadas por Ramon. Os personagens foram melhores trabalhados e eram diretamente ligados ao núcleo principal. A representatividade negra, que estava acima da média na novela anterior (o que não significa muito), também teve uma evolução clara, assim como a eliminação de contextos machistas através de personagens femininas bem construídas, vide o relacionamento abusivo de Nana (Fabíula Nascimento) com Diogo (Armando Babaioff). Se Lili (Vivianne Pasmanter) --- um perfil semelhante a Nana --- estivesse em "Bom Sucesso", haveria um envolvimento tão longo com Rafael, seu ex-genro? Será que Rafael teria um final feliz ao lado de Leila (Carla Salle) depois de ter magoado tanto a Lu e ajudado a dopar Eliza? Aliás, mesclando os personagens, é possível constatar um único caso onde a evolução não foi observada: a da homossexualidade feminina. Adele (Jéssica Ellen) foi um perfil promissor e houve um ótimo conflito através de uma paquera virtual que deu errado com Lu. As duas formariam um lindo casal. Mas Adele perdeu o destaque depois que foi dispensada pela assistente de Carol. Já Gláucia (Shirley Cruz), também negra, lésbica e boa profissional, nem chegou a ensaiar qualquer romance em "Bom Sucesso". Era apenas uma mulher bem-sucedida sem dramas particulares. Uma pena. Mas ao menos na homossexualidade masculina houve um amadurecimento. Max (Pablo Sanábio) era apenas um elemento cômico bajulador de Arthur --- ainda que a homofobia tenha sido bem abordada em um breve momento ---, enquanto William (Diego Montez) teve um romance com Pablo (Rafael Infante).
"Totalmente Demais" e "Bom Sucesso" foram novelas primorosas de Rosane Svartman e Paulo Halm, ambas dirigidas pelo sempre dedicado Luiz Henrique Rios. As duas tramas mereceram o sucesso de críticas, audiência e repercussão. A reprise da saga de Eliza tem rendido ótimos índices para a Globo em plena pandemia do coronavírus e ajudado a relaxar um pouco em meio ao caos que vive o mundo. Mas também tem ajudado a observar melhor o aprimoramento do trabalho de dois autores tão competentes e inspirados ao longo do tempo. Que isso se reflita no futuro terceiro folhetim da dupla, quem sabe no horário nobre.
QUE TEXTO, SÉRIO!!!!!!!!!!!! PALMAS!
ResponderExcluirVocê honra mesmo o título De Olho Nos Detalhes.
ResponderExcluirSérgio, você é, realmente, muito bom em suas postagens. Nada lhe escapa e sua análise é primorosa. Parabéns!
ResponderExcluirOnde eu assino?????????
ResponderExcluirótimas considerações e eu acho que Bom Sucesso é muito melhor que TDemais.
ResponderExcluirEsse troço de arliza foi uma perda de tempo. Em nada agregou a trama e só desgastou o final com essa enrolação. Que bom que mudaram de ideia com Alberto e Paloma.
ResponderExcluirSérgio, só passando para dizer mais uma vez que você tem o faro aguçado para detectar obras de qualidade. Rosane Svartman e Paulo Halm, de fato, fizeram de "Bom Sucesso" (2019) uma ótima evolução em relação à também maravilhosa "Totalmente Demais" (2015). Ávido por notícias sobre os próximos projetos deles na Rede Globo. Merecem todo o prestígio que têm.
ResponderExcluirGuilherme
Encontre essa jóia de peca assistindo a Fazenda no Twitter, muito de acordo com algum dos pontos do texto. A diferença do que se fala não acredito a Eliza seja o melhor personagem da Marina, prefiro em Morde e Assopra e Império. Pelo menos os personagens de essas novelas evoluírem mais positivamente a primeira foi do mimado para a humanidade a segunda da sumição a independência. Os últimos eventos respeito a Arliza vem forcando muito o personagem, inclusive a fazem ficar ainda mais chata, a evolução se sente transparente e confusa, não como nuance mais bem como indecisão, um pouco para o suspense de esse quem matou o quem fica com quem. Sobre a comparação acho que pelo menos TD+ e mais ágil que BS, e até mais carismática, meu problema com BS e que não teve o Joliza e Arliza que prometeu, a gente fala de Marcos e Paloma mais cade Ramon, foi muito barulho por nada, foi uma promessa importante até sendo um personagem afro mais tudo fico demagógico, o que ainda o faz pior asi que ainda acho TD+ um pouco melhor mais longe de uma unanimidade. Mais acho que os autores deviam estar escrevendo para as 21h para ontem, coisas como a volta da Sofia mostra que marcam um linguagem mais denso digno das 21h.
ResponderExcluirPor que "acusar" a personagem Gilda de ser racista por ter demitido Riscado? Em qual momento ela demonstrou ser assim? Que horror essa afirmação sem fundamento. Triste demais essa falta de respeito, que rotula ações até mesmo dentro da ficção.
ResponderExcluirConcordo com o que você fala, só que não se fala com medo de ser chamado de racista. Certamente moramos em uma época de severo revisionismo histórico, o que nos faz apontar que todo tratamento aos afro-descendentes deve ser cuidadoso. Não posso vitimar Riscado pelo fato de ser interpretado por um ator negro, se ele fosse branco, qual seria o termo? Acho que Gilda suspeita de Riscado porque não tem ninguém mais para suspeitar, a Gilda se equivoco muito com seus filhos e uma acusação de robô seria cometer os mesmos erros que com Eliza, ate eu suspeitava só se minha família tivesse criminais ou cleptomaníaco. Acho si, que a desculpa que ela deu foi muito básica, era preciso algo mais profundo mais dai ao racismo e solo pelo cor do ator. Suspeitar acho que qualquer, Eliza e Hugo são milionários agora, as crianças para que ibam à precisar de dinheiro, eles não têm dívida no jogo, nem pagam impostos.
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ResponderExcluirOlá, tudo bem? Já disse que tenho um bloqueio com Totalmente Demais. É um sucesso inegável, mas não sou fã dessa produção. Bom Sucesso é uma das melhores novelas desta década. Abs, Fabio www.blogfabiotv.blogspot.com.br
ResponderExcluirMuito interessante a observação dos detalhes. Olhando a novela novamente, se percebe essa enrolação toda, o que não acontece em bom sucesso. Os autores estão de parabéns e é muito importante que eles tiveram essa evolução como profissionais. Acho que talvez quisessem em TD+ retratar a vida como ela é. Pois o que mais vemos hoje em dia é as distorções das pessoas. Pessoas ruins/machistas ficando com boas. Pessoas com um pingo de amor proprio correndo atrás de "Elizas". Mulheres disputandos cafajestes. É a vida. E não vou dizer que ela é boa se as pessoas vão agir assim. Tuas observações foram muito relevantes. Parabéns pelo teu trabalho. Ser crítico ajuda com que talvez os expectadores vejam a novela por outro prisma.
ResponderExcluirFaltou falar da personagem gay de TD+ praticamente sem trama própria e fazendo o que chamam de "gay cachorrinho de hétero". Em BS teve uma adolescente trans, mas sua história não foi muito explorada...
ResponderExcluirHonrado, anonimo.
ResponderExcluirÉ o objetivo, Gabi.
ResponderExcluirMt obrigado, Marilene.
ResponderExcluirValeu, anonimo.
ResponderExcluirIdem, anonimo.
ResponderExcluirAssino embaixo, anonimo.
ResponderExcluirFico honrado, Guilherme.
ResponderExcluirBom comentário, anonimo!
ResponderExcluirNo momento em que suspeitou do funcionário negro na hora e nem pensou em outra possibilidade, Kellem. É o racismo não declarado, o estrutural.
ResponderExcluirTudo bem, Fabio.
ResponderExcluirAnonimo, claro que o fato está na cor do ator. E tb em ter certeza que na sociedade a desconfiança seria a mesma em cima dele. Querendo ou nao, se o funcionário fosse o Jonatas ela suspeitaria?
ResponderExcluirQue honra, anonimo. Muito obrigado.
ResponderExcluirÉ verdade, anonimo, em Bom Sucesso o William teve um romance e o Max nao. Já no caso da trans eu critiquei mt na época, mas não cabe um comparativo pq em TDemais nao teve trans.
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