A Globo resolveu reprisar dois sucessos do horário nobre em sequência no "Vale A Pena Ver de Novo": "Senhora do Destino" e "Celebridade" (na verdade três, pois agora ainda estreou "Belíssima"). A reapresentação da trama de Aguinaldo Silva rendeu ótimos índices de audiência em 2017, mas o mesmo não pode ser dito da reprise do enredo de Gilberto Braga em 2018. Porém, esse texto não é sobre números e, sim, sobre enredos de produções que viraram clássicos da teledramaturgia. A verdade é que essas duas reexibições ajudaram a comprovar uma situação observada em vários êxitos recentes da faixa nobre da emissora.
Que situação seria essa? Vilãs marcantes como Nazaré Tedesco (Renata Sorrah) e Laura Prudente da Costa (Cláudia Abreu)? Protagonistas fortes como Maria do Carmo (Susana Vieira) e Maria Clara Diniz (Malu Mader)? Não, nada disso. As reprises deixaram evidente uma similaridade negativa entre elas: os fracos núcleos paralelos. Quando se lembra de um grande sucesso ou de um folhetim muito querido, é normal ressaltar as qualidades e minimizar (ou até apagar) os defeitos. Tanto que não faltam casos de novelas que perderam o encanto quando foram reexibidas pelo Viva --- canal a cabo da Globosat ---, por exemplo.
Muitas vezes o público (e até a crítica especializada) esquece a barriga --- período em que nada de relevante acontece --- na história, os conflitos chatos ou então os personagens desinteressantes do roteiro. É algo normal, diga-se. A memória em cima de um produto querido só detém os pontos positivos do mesmo. Isso vale até para situações vividas por cada um ----- todo mundo costuma dizer que "nos velhos tempos tal rotina era melhor", etc.
Vários telespectadores saudosos, inclusive, sempre fazem questão de ressaltar a qualidade das telenovelas do passado, criticando a atual safra de enredos atuais, como se antigamente não existisse trama ruim. Mas existia. E bastante.
Voltando ao "Vale A Pena Ver de Novo", é preciso constatar que "Senhora do Destino" foi um novelão, mas a história de Aguinaldo Silva pecou no ritmo e nos enredos paralelos. Nazaré Tedesco, por exemplo, foi uma vilã que só foi agir de fato pouco depois da metade da novela e isso hoje em dia seria inadmissível. Porém, a víbora fez jus ao posto de uma das mais marcantes da teledramaturgia. O autor errou mesmo em torno dos conflitos secundários. Todos os desdobramentos envolvendo o restaurante de Edgar (Dan Stulbach) era cansativo, assim como o seu romance com Isabel (Carolina Dieckmann). O par formado por Viriato (Marcello Antony) e Maria Eduarda (Débora Falabella) não empolgou e pecou pela repetição de conflitos. Já o 'drama' de Plínio (Dado Dolabella) se esgotou logo quando surgiu, implicando ainda em um subaproveitamento de Helena Ranaldi, intérprete de Yara, mulher que o rapaz engravidou. Até mesmo as falcatruas políticas do corrupto Reginaldo (Eduardo Moscovis) andaram em círculos. O núcleo protagonizado por Shao Lin (Leonardo Miggiorim) foi outro que não disse a que veio, ficando deslocado da trama principal. E a gravidez de Lady Daiane (Jéssica Sodré) se arrastou ao longo dos capítulos.
O sucesso de Aguinaldo ter sido substituído pelo de Gilberto ajudou a analisar melhor o conjunto das obras, além de ter sido uma situação curiosa, pois na época ocorreu exatamente o contrário: "Senhora do Destino" entrou no lugar de "Celebridade", em junho de 2004. E atualmente tem sido possível observar os mesmos pontos mencionados sobre a reprise anterior. Assim como Nazaré, Laura só agiu de fato depois da metade da novela, após longos meses elaborando mil planos para arruinar sua rival. Mas, essa questão é fruto da forma como a telenovela era feita. Não havia ainda essa necessidade de um ritmo mais dinâmico, até porque não concorria com tanta tecnologia como hoje em dia. Os tropeços do autor se deram também nos famigerados núcleos paralelos. As situações protagonizadas pelo deslumbrado Nelito (Taumaturgo Ferreira), por exemplo, eram pretensamente cômicas, mas em nada acrescentavam e o perfil era muito irritante. Os atos heroicos do bombeiro Vladimir (Marcelo Faria) eram outras 'ações' que cansaram com o tempo, assim como as repetitivas reclamações de Ana Paula (Ana Beatriz Nogueira).
O drama de Inácio arrebatou no início e destacou o talento de Bruno Gagliasso, que nem precisava falar em cena. O trauma do rapaz, se culpando pela morte trágica do irmão (Fábio - Bruno Ferrari) e sofrendo pelo desprezo da mãe (Beatriz - Débora Evelyn em grande momento), despertou interesse. O problema é que se desgastou ao longo dos meses e o personagem acabou avulso, principalmente a partir da aproximação de Beatriz com Laura. A sua relação com o pai, Fernando (Marcos Palmeira), era bonita de se ver, mas também se perdeu em virtude das idas e vindas do 'mocinho' com Maria Clara. Aliás, esse romance prejudicou muito a trajetória da protagonista e o casal não tinha a menor química. A relação insossa de Paulo César (Paulo Vilhena) e Sandrinha (Juliana Knust) em nada contribuiu para preencher o tempo dos capítulos e também se mostrou um erro. Até uma personagem querida até hoje pelo público se esgotou ao longo dos meses: Darlene (Deborah Secco). As aventuras da periguete que sonhava em ser famosa viraram um mais do mesmo que não saía do lugar, ao contrário de Jaqueline Joy (Juliana Paes), um perfil bem semelhante, que teve um maior cuidado em torno dos conflitos, despertando mais interesse e fugindo da repetição.
Então, após todos os pontos mencionados, quer dizer que "Senhora do Destino" e "Celebridade" foram péssimas novelas ? De forma alguma. As tramas de imenso sucesso de Aguinaldo Silva e Gilberto Braga mereceram cada elogio recebido na época e entraram para a galeria de folhetins inesquecíveis com louvor. Todavia, os dois enredos apresentaram uma história central primorosa e núcleos paralelos que deixaram bastante a desejar. O conjunto de cada obra resultou em muito mais acertos do que erros, mas passou longe de um total êxito. Curiosamente, algo bem parecido com o que tem ocorrido em várias novelas mais recentes do horário nobre da Globo, que também caíram nas graças da audiência, onde o conflito principal era excelente e os secundários nem tanto. Para pensar.
Que ótimas colocações.Eu mesma me decepcionei muito.Nossa, os núcleos secundários dessas novelas são chatos demais e ainda bem que as reprises picotaram tudo.Por isso nem reclamo das reprises serem resumidas porque não teria paciência pra ver nada disso.E as duas começaram muito lentas também.Bom comparativo.Parabéns.
ResponderExcluirO mesmo vale para A Favorita, Avenida Brasil, O Outro Lado do Paraíso, A Força do Querer, a própria Belíssima que vem aí...Todas novelas com ótimas tramas centrais e péssimas paralelas. Virou sina do horário nobre isso.
ResponderExcluirA Força do Querer com péssimas tramas paralelas? Oi?
ResponderExcluirSim, péssimas. Aquela Silvana fazendo a mesma cena perdendo tudo no jogo e fazendo o marido de idiota, aquele carimbó que só servia pra encher linguiça com participações de cantores ruins, o Ruy contra o Zeca e aquela bobagem de índio com cordãozinho, a Irene tendo como grande missão de vida roubar o marido bananada da outra... Muito legais esses núcleos, não é!
ResponderExcluirSempre perfeito nas palavras! Deixo um abração, desejando tuuuuuuudo de bom! chica
ResponderExcluirNão lembro da novela Belíssima ter pessimas tramas paralelas.
ResponderExcluirA trama da Silvana era cansativa, mas não era de todo ruim, Lilia Cabral estava ótima e o núcleo tinha uma boa mesclagem de drama e comédia.Irene foi uma vilã fraca msm a Glória Perez não é boa nesse tipo de personagem.E a trama da Ritinha realmente era chata e andou em círculos o tempo todo, mas não era paralela, Ritinha era uma das protagonistas junto com Jeiza e Bibi e estava ligada a elas.
ResponderExcluirNa época dessas duas novelas mencionadas já havia internet e algumas redes sociais, mas creio que nesse período não se comentava tanto sobre dramaturgia televisiva na internet como hoje em dia. Logo não havia tanta cobrança do público em relação a agilidade da trama. E talvez com isso grande parte do público ainda "tolerava" erros no enredo da trama.
ResponderExcluirConcordo com o texto. E de fato, vejo isso se repetir atualmente. Em Segundo Sol, ainda estou gostando dos núcleos paralelos, mas não confio muito no JEC pra isso não, vide Pai Helinho, Cadinho, e o pior de todos, Merlô. Mas enfim, vamos ver. Quanto às reprises, de fato Inácio e Sandra eram um porre (e olha que eu costumo gostar de casais jovens), Darlene era chata e repetitiva, mas confesso que gosto do Nelito, rs, principalmente quando começou a se envolver com a Eliete, lembro que era meu casal favorito da novela na infância. Ainda assim, considero Celebridade superior à Senhora e Belíssima, e fiquei bem triste com a picotada que deram na novela.
ResponderExcluirAh, e mais uma semelhança que as novelas tem é o casal principal sem química alguma. Sorte que Aguinaldo reverteu isso e Maria do Carmo terminou a história com Giovani e não com Dirceu, assim como Maria Clara deveria ter terminado com Hugo. No caso dela Fernando, como vc bem citou, chegou até a atrapalhar a trajetória da personagem, que era lembrada por mim como apagada, mas na reprise se mostrou maravilhosa - quando longe de seu par insosso.
ResponderExcluirAnálise perfeita Sérgio e eu nunca, em tempo algum, havia olhado esses clássicos novelescos por esta ótica!!
ResponderExcluirVocê é um gênio na análise da teledramaturgia contemporânea...Diria que o melhor!!
E quem se esquece da Nazaré? Ela é meme ate hoje...rsrs
Uma vilã maravilhosa, mesmo que as tramas que a rodeavam tenham sido insignificantes...
Mas o que importa é se divertir com as novelas né amigo?
Um beijão e um lindo restante de semana!! :))))
Cada um teve seus pontos fortes, fracos e marcantes.
ResponderExcluirNazaré virou clássico eterno, adoro rs...
bjokas =)
Parabéns pela análise Sérgio. Acho fundamental ter uma boa escalação do elenco para todas as tramas, não adianta elenco bom com enredo paralelo fraco.
ResponderExcluirbig beijos
Só discordo do último parágrafo. Justamente por causa de todos os problemas apontados tão bem por você que não acho que as novelas mereçam tantos elogios assim porque não foram ótimas mesmo.Foram no máximo medianas.
ResponderExcluirOlá Sérgio
ResponderExcluirExcelente e reflexivo texto!
Visto por ângulos que geralmente passam despercebidos e que com o tempo se misturam com o mote.
Confere reflexão sobre a importância e relevância dos núcleos paralelos em se inserirem e acrescentarem qualidade às narrativas.
Concordo totalmente com a Dri, vc é o melhor em análise de teledramaturgia contemporânea.
Bjs Luli
https://cafecomleituranarede.blogspot.com.br
Pra começar você é o melhor crítico de TV no Brasil .
ResponderExcluirE Celebridade foi um porre mesmo.
Laura que era minha vilã favorita ,perdeu lugar pra Raquel Assunção de Mulheres de Areia.
Muito obrigado, Gisela.
ResponderExcluirJoana, acabou virando um parâmetro mesmo. Com poucas exceções.
ResponderExcluirObrigado, Rejane!!!
ResponderExcluirA única trama paralela ruim de Belíssima, anonimo, foi o triangulo da Camila Pitanga, Alexandre Borges e Leopoldo Pacheco. O resto foi tudo ótimo. Por isso mesmo ela não se encaixa nesse comparativo. Senão a incluiria.
ResponderExcluirSim, anônimo, mas ainda estava muito no comecinho. Nem se compara a hoje em dia. A própria fórmula da novela tinha outro ritmo.
ResponderExcluirNossa, Malu, eu não suportava nem ouvir a voz daquele Nelito...
ResponderExcluirMalu, ótima observação. Os mocinhos sem química alguma foi outra semelhança. Em SDD o autor realmente foi esperto em colocar o genial Giovanni Improta como par, já o outro preferiu insistir no erro.
ResponderExcluirAdriana, obrigado pelo seu imenso carinho sempre. bjsssss
ResponderExcluirVirou mesmo, Bell. bjs
ResponderExcluirValeu, Lulu!
ResponderExcluirEntendo, Ulisses.
ResponderExcluirLuli, fico honrado em ler isso. Beijão!
ResponderExcluirMuito obrigado, Cláudio. Me deixou feliz! abçsss
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